8.1.11 – Cerco do Porto - Morte de D. Pedro IV e seu testamento, D. Pedro IV deixa seu coração ao Porto, Coração de D. Pedro IV na Igreja da Lapa, Novas armas do Porto por D. Maria II, Exposição e veteranos do Cerco do Porto
Estátua de D. Pedro IV – Foto do início do séc. XX
Foi seu escultor Célestin Anatole Calmels. Fundida em Bruxelas, custou cerca de 30 contos de reis. Mandada fazer em 1862 para comemorar os trinta anos do desembarque no Mindelo, foi inaugurada em 19 de Outubro de 1866. O pedestal foi feito pelo canteiro Joaquim Antunes dos Santos. D. Pedro segura na mão direita a Carta Constitucional de 1826 e na esquerda as rédeas do cavalo.
Uma charada muito antiga do Porto é: Qual é a pata direita do cavalo de D. Pedro?
Medalha comemorativa da inauguração da estátua de D. Pedro IV - 1867
Não podíamos terminar este capítulo sobre o Cerco do Porto sem referir a vontade expressa por D. Pedro IV à rainha D. Amélia, sua esposa, de deixar o seu coração à cidade do Porto.
D. Pedro IV após a sua morte – desenho de Dias da Costa – in Pintrest.pt
Em O Tripeiro, Série VII, Ano XVIII, nº. 7-8, o Senhor Professor Doutor Francisco Ribeiro da Silva escreve: “ O Rei-Soldado, pouco depois de levantado o sítio e da victória definitiva do Liberalismo, faleceu precocemente no Palácio de Queluz, às duas horas e meia da tarde do dia 24 de Setembro de 1834. Na véspera do triste apagamento, dia 23 pelas quatro horas da manhã, sentindo-se desfalecer, dirigiu-se aos brasileiros, manifestando-lhes a sua dedicação e aproveitando para ditar algumas últimas vontades. Entre elas, destaca-se a de deixar o seu” coração à heróica cidade do Porto, theatro da minha verdadeira glória…””.
Fotografia do pergaminho do auto da entrega do coração de Dom Pedro IV à cidade do Porto – in Monumentos Desaparecidos
No pedestal encontram-se dois altos-relevos representando, um o desembarque no Mindelo e a entrega da Bandeira a Tomaz de Mello Breyner, o outro a entrega do coração de D. Pedro IV ao Porto, que se encontra na Igreja da Lapa.
Foto de José Pedro Durão
Chaves do mausoléu onde se encontra o coração de D. Pedro IV – in Porto 24
Arquivo da Câmara Municipal do Porto
“A autenticidade do coração de D. Pedro IV nunca esteve em causa, mas foi longo e conturbado o percurso que levou o órgão doado à cidade e até ao monumento onde está desde 1837, na Igreja da Lapa, Porto.
“Depois da morte de D. Pedro, em Setembro de 1834, a sua mulher, D. Amélia, fez encerrar o coração num escrínio (uma espécie de vaso, ou guarda-jóias) com 2 tampas e entregou-o ao ajudante de campo do rei que veio de Lisboa para o Porto num navio”, descreve o historiador Ribeiro da Silva, mesário da Ordem da Lapa.
O coração chegou ao Porto em Fevereiro de 1835, quase 5 meses após a morte do monarca, foi “em procissão da Ribeira para a Lapa” e “toda a cidade esteve presente”, acrescenta.
“D. Pedro ofereceu o coração ao Porto porque viveu aqui durante os meses do Cerco do Porto [entre Julho de 1832 e Agosto de 1833] e houve entre ele e a população uma cumplicidade enorme”, assegura o professor.
“Foi um gesto único na história de Portugal”, destaca o historiador, para quem não se tratou de amor à primeira vista: “No início a cidade não aderiu em massa, mas depois o rei deu provas de grande abnegação e grande heroicidade e o povo simpatizou imenso com ele”, justifica.
O coração chegou à Lapa numa urna de madeira de mogno, dentro da qual estava um estojo (o original foi a única peça substituída, mas mantém-se na igreja) e, lá dentro, um vaso de prata dourada com 2 tampas.
“Uma era uma espécie de adorno e a outra, presa com parafusos, dava acesso ao coração, inserido em líquidos conservantes desde a primeira hora”, descreve o mesário.
Na altura, “os professores da escola médico-cirúrgica entenderam que o coração ficaria melhor conservado num recipiente de vidro, por se tratar de um material mais estanque do que a prata.
Dois anos para decidir local
Seguiram-se “2 anos de espera” para a Câmara e a Irmandade da Lapa “chegarem a acordo sobre sítio onde devia ficar o monumento”, período durante o qual o coração “ficou na capela-mor à guarda de uma sentinela, porque havia receios que fosse roubado”, acrescenta.
Foi edificado “do lado do evangelho por um arquitecto da Câmara que tentou representar o Brasil e Portugal, as armas da Casa de Bragança e as armas militares. O granito é todo do Porto, foi escolhido o mais fino. É um ex-líbris da cidade e da igreja”, descreve Ribeiro da Silva.
O coração foi doado à cidade e não à Igreja da Lapa, motivo pelo qual foi necessário que a filha de D. Pedro, D. Maria II, resolvesse o dilema sobre o local onde devia ficar o legado, relata.
“Quando veio para o Porto, D. Pedro ficou no Palácio dos Carrancas (onde está hoje o Museu Soares dos Reis), mas era um sítio muito exposto. Teve de recolher para um mais protegido. Ficou a morar na Rua de Cedofeita, mais ou menos no local onde está hoje a esquadra da PSP”, acrescenta.
A igreja próxima era a da Lapa e o seu fundador “era um brasileiro”. “Pelo menos à missa semanal vinha. Tenho visto escritos de que vinha à missa todos os dias aqui. Daí que D. Maria II quisesse que o coração ficasse aqui”, explica o historiador.
Para Ribeiro da Silva, o coração “significou uma coisa importantíssima: o amor pela liberdade”.
O relato na imprensa da época
Segundo o relato do jornal portuense “O Artilheiro”, de 14 de Fevereiro de 1837, reproduzido pela revista O Tripeiro, a cerimónia religiosa da “chegada do Augusto Coração” à Igreja da Lapa cumpriu-se a 12 de Fevereiro daquele ano. O coração, sem os mais “remotos sintomas de corrupção”, já havia sido mudado do vaso onde tinha sido transportado para um vaso maior de vidro e que “depois foi encerrado na Urna de Prata que actualmente existe”.
Antes de ser encerrada no mausoléu esculpido em pedra “retirada das magníficas pedreiras dos arrabaldes da cidade, onde se erigiam as Baterias da linha da sua defesa”, o “vidro com o Imperial Coração” esteve exposta no centro da igreja, num altar fúnebre em que era possível ler o seguinte verso: “Coração que bateste em tal peito./Onde morto acharás egual largueza?/No Porto disse o herói…oh gran fineza!/ardor sublime! feito nunca feito!”
Foi o presidente da Câmara, Luciano Simões de Carvalho, que após as cerimónias colocou a urna com o coração no interior do mausoléu, enquanto a artilharia fazia “soar uma salva real de vinte e um tiros de peça, alternando 3 descargas de fuzilaria da tropa ali estacionada, acabando de dobrar os sinos em todas as igrejas da cidade”. In Porto 24 de 11/3/2013
E assim se fez: o coração foi depositado na capela-mor da igreja da Lapa, num sarcófago cuja chave está na gaveta da secretária do presidente da Câmara.
Em 1837 D. Maria II determinou que: "as armas sejam esquarteladas com as do reino e tenham ao centro, num escudete de púrpura o coração de oiro de D. Pedro, sobrepojadas por uma coroa de duque, tendo por timbre o "Dragão negro das antigas Armas dos senhores Reis destes reinos", e junte aos seus títulos o de Invicta."
Vídeos sobre o coração de D. Pedro na Lapa
https://www.youtube.com/watch?v=EUicOto3r7k
Paço Episcopal danificado por fogo de artilharia da Serra do Pilar durante o cerco do Porto – gravura de 1839
Exposição de Amália da Silva Chaves, no início do século XX. - um salão com peças, fardas e desenhos alusivos ao Cerco do Porto.
Veteranos do cerco do Porto em
29/7/1883
Porto na hora azul – maravilhosa foto de Manuel Varzim – Abril de 2017
O Porto e o seu passado – documentário da RTP por José Hermano Saraiva