sexta-feira, 15 de junho de 2012

BAIRROS DA CIDADE - I

2.3 Bairros da Cidade



Eugénio Andreia da Cunha e Freitas, em Toponímia Portuense, escreve: “O audacioso plano urbanístico da cidade concebido por João de Almada e Melo – o primeiro ou um dos primeiros projectos de conjunto realizados na Europa, segundo nos dizem -, abrangia uma série de ruas e praças ligando-se entre si, linha axial de um extremo ao outro da urbe: Praça da Ribeira, Rua de S. João, Largo de S. Roque, Praça Nova, Rua do Almada, Campo de Santo Ovídio.” Era, na verdade, um plano estruturante relativo ao futuro desenvolvimento da cidade.


  
2.3.1 - Bairro da Sé - I


Sé, casa do Cabido, Paço Episcopal e Pelourinho de 1940 – foto Beleza

A primitiva Sé do Porto data do séc. VI, mas dela nada resta. A actual foi construída no séc. XII, no tempo do Bispo D. Hugo. Foi, através dos tempos, muito alterada, interior e exteriormente, em especial nos séc. XVII e XVIII. Daremos mais pormenores da Sé e do Paço Episcopal nos capítulos que lhes dedicaremos.



Vê-se ainda um dos vários altares laterais barrocos – foto Alvão


Sé – Galilé de Nicolau Nazoni – século XVIII


Ao fundo vê-se o Mosteiro da Serra do Pilar – Em 1940 todo este casario em frente à Sé foi demolido para dar lugar ao actual Terreiro D. Afonso Henriques




Largo da Sé – Vê-se a entrada da Sé, Casa do Cabido, portão e Paço Episcopal e a Capela dos Alfaiates ou Nossa Senhora de Agosto.


Funeral do Cardeal D. Américo em 24/1/1899 - Jaz na cripta da Capela Mor da Sé - foto gentilmente cedida por um familiar



A Capela da Confraria de Nossa Senhora de Agosto ou dos Alfaiates ainda em frente da Sé, antes da demolição de 1936 e reconstrução no largo Actor Dias. Começou a ser construída em 1554, mas só onze anos depois se concluiu. Os padroeiros dos alfaiates são Nª. Sª. de Agosto e São Bom Homem.




Capela dos Alfaiates ou de Nossa Senhora de Agosto foi apeada de fronte da Sé em 1936, mas só em 1953 foi reconstruída no Largo actor Dias



Imagem de Nossa Senhora de Agosto, em barro - foto Portojo


Imagem de S. Bom Homem  - foto Portojo

(continua)



sexta-feira, 8 de junho de 2012

LIMITES DA CIDADE - IV


2.2.6 – Limite Sul


Pormenor do mapa de Telles Ferreira - 1892

A cidade do Porto incluiu até 1834 a parte de Vila Nova de Gaia que vai até à R. do Marquês de Sá da Bandeira e Largo dos Aviadores, incluindo a Serra do Pilar. Durante o cerco do Porto os Miguelistas tentaram tomar o reduto da Serra do Pilar, mas os chamados “Polacos”, sob o comando de Bernardo Sá Nogueira não o permitiram, defendendo-o energicamente. Este, depois feito Marquês de Sá da Bandeira, foi ferido no baço direito na batalha que decorreu no Alto da Bandeira ( actual Largo dos Aviadores) . Levado para o Hospital militar, sedeado no palacete da família Guedes da Aveleda na Batalha, foi-lho amputado e enterrado junto de uma árvore do jardim. Os valentes soldados que resistiram foram chamados de “Polacos” em honra dos que heroicamente defenderam Varsóvia na guerra contra os Russos.



Bernardo de Sá Nogueira, Marquês de Sá da Bandeira – 1795-1876



Convento Serra do Pilar – gravura de J. Holland – 1838



                    Mosteiro da Serra do Pilar – em 1º. Plano a Muralha Fernandina

O primitivo convento foi construído no então chamado Monte de S. Nicolau ou Meijoeira, para substituir o de Grijó que estava muito velho e arruinado. Foi autorizada a construção do mosteiro, em 1537, por D. João III no tempo do Bispo do Porto D. Frei Baltazar Limpo. A actual igreja começou a construir-se em 1598, e foi inaugurada em 1602, conforme data escrita no claustro.

Curiosidade: pelo que já lemos há anos, para a construção da cúpula da Igreja da Serra do Pilar foram utilizados altos troncos para a escorar. Assim que terminada, as autoridades tiveram receio que a mesma se desmoronasse se os troncos fossem retirados. Desta forma a Igreja não foi utilizada durante dezenas de anos. Com o tempo os troncos, apodrecidos, caíram, mas a cúpula manteve-se segura. Será lenda?




Monumento em homenagem a Gago Coutinho e Sacadura Cabral

O Alto da Bandeira situava-se no local que hoje se chama de Largo dos Aviadores, em honra de Gago Coutinho e Sacadura Cabral. Estes realizaram a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, entre Lisboa e o Rio de Janeiro. Saídos em 30/3/1922 só chegaram ao Rio em 17/6/1922. Tiveram grandes problemas técnicos e o primeiro avião afundou-se numa amaragem. Tendo o navio Carvalho Araújo levado um segundo avião, os aviadores conseguiram concluir a Viagem.


Adenda à publicação de Domingo 3 de Junho – LIMITES DA CIDADE – III

Já depois de feita esta publicação,sobre a Igreja da Lapa, encontrámos um interessantíssimo artigo de Horácio Marçal, em O Tripeiro Série VI, Ano I que contem alguns pormenores que a enriquecem: “Serviço permanente de confissões (as noturnas para os que evitavam ser conhecidos) devia manter a capela; por tal razão construiu-se junto dela um hospício (destinado à habitação dos padres confessores), em cuja roda se depositavam os objectos roubados para serem restituídos a seus donos. Eis o que motivou a invocação da capela, a da Nossa Senhora da Lapa das Confissões.
Breve se reuniram alguns devotos com o projecto de formarem uma irmandade, a qual foi aprovada por Benedicto XIV, em bula de 29/7/1755”.




“As pedreiras ali existentes faziam parte do chamado monte da Lapa, no cimo do qual, como adiante diremos funcionou um telegrafo – o Telegrafo da Lapa – e o terreno destinado a uma praça e espraiado para passeio e desafogo e retiro do público, converteu-se numa frondosa e frequentada alameda, que não obstante ter sido logradouro público, veio a servir para nela se edificar o actual Hospital da Lapa, cujo terreno, pertencente à Câmara, só em 1925 por um preço convidativo, veio a ser adquirido pela respectiva irmandade”




Fonte de Salgueiros ou da Lapa


“Para a formação deste jardim, (no quartel de Infantaria 18) foi necessário destruir uma fonte que havia junto do portão do dito quartel, que ficava num sítio fundeiro e para o qual se descia por uma rampa, e construir uma outra fonte em sua substituição, na embocadura da rua de Salgueiros, para onde as águas, como é obvio, tiveram de ser desviadas. Data, pois, a construção da actual Fonte de Salgueiros, que está por baixo e encostada ao muro do jardim da Ordem da Lapa, do ano de 1818.”




domingo, 3 de junho de 2012

LIMITES DA CIDADE - III


2.2.5 Limite Norte - Lapa

O Culto a Nossa Senhora da Lapa vem desde 1498. Ao subir a serra da Lapa encontramos um dos mais antigos e famosos santuários portugueses, que atrai peregrinos de todo o país. A capela inicial de Nossa Senhora da Lapa foi construída pelo povo logo após a aparição da imagem. Mas o culto é muito anterior, havendo quem o remeta para o século X, quando as investidas dos mouros fizeram com que a população cristã tenha escondido uma imagem da Virgem numa gruta ou "lapa" na Serra do mesmo nome, diocese de Lamego.

You Tube – Santuário de Nossa Senhora da Lapa
http://www.youtube.com/watch?v=7EFEjlCC-xY



Capela do Santuário e capela original na rocha


Imagem no Santuário e penedos estreitos - diz a lenda que só passam entre estes dois penedos quem não tiver pecados mortais!


Antiga cadeia – o actual Reitor da Lapa, Rev. Padre José Amorim, transformou este caduco edifício numa esplêndida hospedaria onde recebe sacerdotes que necessitam de descanço.


Antigo colégio dos Jesuitas. A primeira pedra foi lançada em 28/6/1685 e a construção demorou algumas dezenas de anos. Estava muito arruinado e foi transformado em  centro de acolhimento dos peregrinos e casa de retiros, pelo actual Reitor.


“Capela oriunda da freguesia de Quintela, foi doada por um habitante da região e mais tarde transferida pedra a pedra para a Lapa, onde actualmente, nos dias de maior afluência de peregrinos, nomeadamente nos dias de romaria, serve para a celebração de uma missa campal, pois com a enorme afluência de devotos o Santuário torna-se pequeno.” site de Sernancelhe.



O povo costumava, em momentos de grande aflição, fazer promessas a Cristo, Nossa Senhora ou Santos da sua devoção. Entre os diversos tipos de promessas contava-se a representação, num quadro, a graça recebida. São inúmeros os ex-votos encontrados por todo o país e o mesmo acontece no Santuário de Nossa Senhora da Lapa. O da direita recorda o “Milagre que fez nª. Sª da lapa a João Ribeiro Santo Sisto Junior que lebou uma facada e a senhora lhe deu saúde”.

O culto de Nossa Senhora da Lapa no Porto



A Irmandade de Nossa Senhora da Lapa foi instituída em 1755 pelo Papa Bento XIV




Para o Porto a devoção foi trazida do Brasil pelo Padre Ângelo de Sequeira, nos meados do séc. XVIII. Em 1755 foi construída uma pequena capela, no cimo do monte de Germalde, cuja frontaria se encontra nas traseiras da actual igreja, virada a nascente. Os capelães dedicavam-se ao Sacramento da Confissão, pelo que veio a chamar-se Irmandade de Nossa Senhora da Lapa e Confissões. Confessavam pessoas de todos os estratos sociais que não queriam ser vistas. Daí haver um contínuo turno de confissões, inclusive durante a noite. Iam lá também ladrões e malfeitores, que por vezes devolviam os bens roubados. Em 1756 iniciou-se a actual Igreja que só foi concluída em 1863.


Capela da Lapa ao abandono




Este colégio foi frequentado por alunos que se vieram a distinguir nas letras e ciências, tais como Eça de Queiroz e Ricardo Jorge. O filho do director era José Ramalho Ortigão que mais tarde foi lá professor e director.
A zona da escola para os meninos foi anteriormente a primeira Capela de Nossa Senhora da Lapa e das Confissões, desactivada quando foi construída a nova Igreja.




Altar Mor – foto do blog Inbikta



Foi a 8 de Julho de 1832 e D. Pedro IV entrou no Porto em 9. Autor Roque Gameiro



        Foto de José Pedro Durão

You Tube - Video sobre o coração de D. Pedro IV
http://www.youtube.com/watch?v=iDekl8nHLB4&feature=related

Em O Tripeiro, Série VII, Ano XVIII, nº. 7-8, o Senhor Professor Doutor Francisco Ribeiro da Silva escreve: “ O Rei-Soldado, pouco depois de levantado o sítio e da victória definitiva do Liberalismo, faleceu precocemente no Palácio de Queluz, às duas horas e meia da tarde do dia 24 de Setembro de 1834. Na véspera do triste apagamento, dia 23 pelas quatro horas da manhã, sentindo-se desfalecer, dirigiu-se aos brasileiros, manifestando-lhes a sua dedicação e aproveitando para ditar algumas últimas vontades. Entre elas, destaca-se a de deixar o seu” coração à heróica cidade do Porto, theatro da minha verdadeira glória…””.


  
Órgão de tubos romântico, construído por Georg Jann, em 1995. No dia da sua inauguração, Maio de 1995, foi tocada a obra de Widor (1834-1937) que este compôs e executou na inauguração do orgão do Palácio de Cristal em 1865.

You Tube – Video sobre Igreja da Lapa



“O hábito de utilizar o interior das igrejas como cemitério vem quase desde o início do Cristianismo, apesar de ter sido muitas vezes considerado abusivo, uma vez que implicava o enterramento de pecadores lado a lado com relíquias de santos. Porém, a Igreja Católica nunca conseguiu evitar esse facto. Só raramente os mortos eram sepultados longe das igrejas: aquando de grandes mortandades e no caso de falecidos fora do catolicismo. A pressão demográfica e as questões higiénicas, num contexto ideológico Iluminista, foram os principais factores que fizeram com que, a partir do século XVIII, algumas vozes se levantassem contra as inumações no interior das igrejas. Em Portugal, as primeiras tentativas legislativas no sentido de acabar com os enterramentos nas igrejas não deram resultados, muito porque o processo de laicização da sociedade portuguesa estava bastante retardado em relação a outros países europeus. Assim, foi necessário que muita tinta corresse até que os cemitérios públicos portugueses fossem oficialmente criados, em 1835. Porém, existiram experiências anteriores e o Porto, como em quase tudo nessa época, foi pioneiro na criação de cemitérios fora das igrejas. 

Em 1833, o Cerco do Porto gerou uma situação extremamente difícil de salubridade na cidade e favoreceu o surgimento duma epidemia muito mortífera: o cholera morbus. Esta rapidamente lotou os locais de enterramento, facto agravado pelos soldados que iam morrendo nas investidas dos Miguelistas. Perante este cenário, foi necessário recorrer ao chão de algumas igrejas que nem sequer estavam totalmente construídas (como a da Trindade) e aos terrenos anexos de outras, para sepultar tantos cadáveres. Nesse ano, a Mesa da Irmandade de Nossa Senhora da Lapa pediu a D. Pedro IV que autorizasse a construção de um cemitério privativo. A Mesa poderia ter em mente um mero terreno anexo temporário para sepulturas. Mas todo o processo de construção do posterior Cemitério da Lapa parece mostrar que, já em 1833, a Irmandade da Lapa pretendia um cemitério "ao moderno". Ou seja, convenientemente murado, enobrecido com portal, com locais próprios para a construção de monumentos, tal como se fazia já há algumas décadas em Paris, cidade modelo para quase tudo na época. Por isso, o Cemitério da Lapa é considerado o cemitério "moderno" mais antigo do Porto, mesmo não sendo público, até porque foi criado antes do decreto de 1835. Contudo, como situação de transição, foi necessário estabelecer um cemitério interino, por detrás da capela-mor da respectiva igreja. O Cemitério da Lapa propriamente dito só foi oficialmente benzido no Verão de 1838, tendo os primeiros monumentos surgido em 1839". Site da C.M.P. 
Neste cemitério estão sepultadas algumas das figuras mais destacadas da nossa cidade tais como: Camilo, Arnaldo Gama, Soares de Passos, Silva Porto, Alves da Veiga, Raul de Caldevilla e Heitor Campos Monteiro. Estiveram durante uns anos os restos mortais da infeliz Fanny Owen que depois de raptada por José Augusto Pinto de Magalhães, e com ele ter casado em 5/9/1853, morreu tuberculosa após um trágico romance amoroso. Ele também morreu no mesmo ano.


Em 1800 a Junta das Obras Públicas ofereceu à Irmandade da Lapa um terreno com a condição de se conservar exclusivamente ao uso do público, sem qualquer construção. Foi criada uma bela alameda muito conhecida por se realizar aí a célebre festa do S. João da Lapa, a que já nos referimos. 



A irmandade decidiu construir, na referida alameda, um hospital. Para tal a D. Luzia Joaquina Bruce contribuiu com dinheiro e acções no valor total de duzentos contos de reis. Assim, em 18/8/1902 foi lançada a primeira pedra pelo bispo D. António Barroso. O autor do projecto foi o Arq. Joaquim Augusto Pinto Basto. Ainda por concluir foi inaugurado em 28/9/1904. Por dificuldades financeiras este hospital não pode ser concluído de uma só vez. Em 16/11/1948 faleceu a Snª. Condessa de Santiago de Lobão, tendo deixado parte dos seus bens à Irmandade. Com estes valores pôde finalmente terminar-se o hospital nos anos 50 do século XX.


Capela do Senhor do Socorro, antigamente chamada do “Senhor do Olho Vivo” - foto de J. Portojo


O Dr. Eugénio Andrea da Cunha Freitas em seu livro Toponímia Portuense escreve que “A capela do Senhor do Olho Vivo já existia junto do padrão velho de Santo Ovídio em 1755, quando se começou a edificar a Igreja da Lapa. Sob o altar desta capela está ou esteve um cruzeiro datado de 1622 com as imágens de Cristo e de Santiago que dizem ter sido levantado por peregrinos indo a Compostela. Seria talvez o referido padrão velho de Santo Ovídio. Segundo a tradição, recolhida pelo nosso bom amigo Horácio Marçal, a curiosa denominação do Senhor do Olho Vivo derivava de se recomendar aos caminhantes que tivessem “olho vivo”, para se defenderem dos ladrões que se acoitavam nas trazeiras da capela, nesse lugar então solitário. O falecido Engº. Monteiro de Andrade atribuia ao topónimo outra origem: “existia aqui uma casa onde esteve instalado um telégrafo óptico, por tal motivo chamavam-lhe sugestivamente o lugar do”olho vivo”. No princípio do nosso século (XX) passou a denominar-se Capela do Senhor do Socorro”.