sábado, 30 de abril de 2016

AS ORIGENS DO FUTEBOL NA CIDADE DO PORTO - I

É com muita alegria que recebemos contribuições dos nossos caros leitores sobre o tema da cidade do Porto. 
Um amigo e assíduo leitor dos nosso blogue enviou-nos um estudo sobre AS ORIGENS DO FUTEBOL NA CIDADE DO PORTO que não podíamos deixar de acrescentar aos nosso estudo, pois a sua qualidade e assunto têm muito interesse; e acrescenta uma visão diferente aos dois lançamentos que, sobre este assunto, já publicámos em 29/1/2014 e 18/5/2014. 
Dada a sua extensão envia-lo-emos por duas vezes para não maçar demasiado.
Muito obrigado ao António Coutinho Coelho pela sua autorização editarmos o seu belíssimo estudo.

AS ORIGENS DO FUTEBOL NA CIDADE DO PORTO 
Por António Coutinho Coelho 

Na cidade do Porto persiste em funcionamento e em plena actividade o clube desportivo mais antigo do país, o Oporto Cricket and Lawn Tennis Club, fundado em 1855, uma das mais antigas agremiações dedicada ao remo e natação, o Clube Fluvial Portuense (1876) e o clube de golf mais antigo de toda a Península Ibérica, o Oporto Golf Club (1890). 

Em 1893 funda-se o Football Club do Porto de Nicolau de Almeida. De realçar, ainda, o Boavista Footballers, criado em 1 de Agosto de 1903, o Sport Progresso em 15 de Agosto de 1908 e o Sport Porto e Salgueiros em 8 de Dezembro de 1911, bem como o Leixões Sport Clube em 28 de Novembro de 1907 e o Sporting Clube de Espinho em 11 de Novembro de 1914. 
Sobre o futebol no Oporto Cricket nada de relevante encontramos. E, no entanto, “O futebol foi introduzido pelo Oporto Cricket Club, há muitos anos”. In O Tripeiro, Volume 3 , 20/8/1910 

1. O FOOTBALL CLUB DO PORTO, de Nicolau d’Almeida 
"Fundou-se no Porto um club denominado Football Club do Porto, o qual vem preencher a falta que havia no norte do paiz, de uma associação para os jogadores d'aquella especialidade. No segundo domingo de Outubro inaugura-se o club officialmente, com um grande match entre os seus sócios no hyppodromo de Mattozinhos. Ouvimos dizer que serão convidados alguns clubmen de Lisboa. Que o Football Club do Porto apure um grupo rijo de jogadores e que venha medir-se ao campo com os jogadores do Club Lisbonense, do Real Gymnasio Club, do grupo de Carcavellos ou de Braço de Prata, para animar os desafios de football como já o são as corridas de cycles. Eis o que desejamos." (notícia no Diário Illustrado de 28 de Setembro de 1893) 
A sua criação deveu-se a António Nicolau d’Almeida, comerciante de vinho do Porto, que tinha conhecido o futebol nas suas frequentes viagens a Inglaterra. Não tinha, no entanto, actividade regular, para além dos encontros entre os seus sócios. 
O Clube Lisbonense era o único clube praticante dessa modalidade em Lisboa, enquanto que na cidade do Porto nada havia de semelhante. Em 1884, Guilherme Pinto Basto, que estudava em Inglaterra, trouxe como recordação para Portugal a primeira bola de futebol, que causou muita estranheza entre seus amigos; posteriormente, em 1888, seus irmãos Eduardo e Frederico trouxeram também uma bola. Então, os três irmãos, que na Grã-Bretanha tinham aprendido as técnicas e as leis do jogo, começaram a interessar os amigos para o futebol que passaram a praticar aos domingos. Os irmãos Pinto Basto decidiram, então, formar um Clube, que denominaram de Lisbonense. 
O Rei D. Carlos, com quem ambos os presidentes mantinham relações de amizade, propôs que fosse organizada uma partida de futebol integrada nas comemorações oficiais do quingentésimo aniversário do nascimento do Infante D. Henrique, que se comemorava nesse ano. Disponibilizou-se ainda a oferecer uma taça em ouro e prata, a “CIRP”, com o seu próprio nome para que fosse atribuída ao vencedor, impondo para tal duas condições: cada uma das equipas deveria alinhar com um mínimo de seis jogadores portugueses, determinação que não viria a ser cumprida, e os clubes teriam que jogar em representação das respectivas cidades. Assim, embora estivessem em campo o FC Porto e o Club Lisbonense, disputava-se na realidade um Porto x Lisboa.


A equipa de Lisboa com a taça conquistada

A partida realizou-se no Rua do Campo Alegre, no campo do Oporto Cricket and Lawn-Tennis Club. Tendo os monarcas, cuja viagem de comboio de Lisboa ao Porto durou cerca de 14 horas, chegado quando já decorria a segunda parte, as equipas acederam jogar dez minutos para além dos noventa regulamentares, sem que os golos marcados nesse período contassem para o resultado final. Venceu Lisboa por 1-0, tendo marcado ainda um segundo golo no tempo extra.
Nas páginas de «O Sport», o primeiro jornal desportivo de Portugal, o registo da recepção, em tom que não permitia margem para dúvidas, vincando, inclusivamente, a falta de ambiente oficial para a propaganda do futebol e ainda o reflexo político bem quente do Ultimato na população do Porto, sobretudo depois da revolta dos republicanos de 31 de Janeiro: «Às 4 h e 13, Suas Majestades e Altezas, acompanhadas pela sua comitiva, entraram no Campo Alegre, sendo recebidos pelo cônsul e consulesa de Inglaterra, no meio dos mais entusiásticos hurras levantados pelas pessoas presentes. Continuando o jogo, 4 minutos depois de Suas Majestades e Altezas chegarem ao campo, os forwards de Lisboa marcaram um goal». Ironia muito mais subtil se encontraria nas páginas de «O Século», jornal já declaradamente simpatizante de ideais republicanos, que notou que «à entrada do campo, bem como à saída, as Majestades foram muito vitoriadas, principalmente por ingleses, pois quase todos os espectadores pertenciam à colónia inglesa».
Como resultado do jogo ficou a vitória dos lisboetas, por 1-0. Apesar de dois golos marcados. O primeiro fora apontado quando faltavam 14 minutos para o intervalo e insolitamente anulado. 
«A bola, marcado um pontapé de canto, bateu no braço de A. Nugentt, um dos defesas do Porto, entrando, de ricochete, nas redes do Norte. A equipa portuense contestou a validade do ponto, por motivo de ter havido mão antes, mão que não fora denunciada, ou que pelo menos o refere não julgou intencional. Eduardo Ferreira Pinto Basto considerou válido o goal, mas o jogo não recomeçou a meio do campo. Não contou pois. O único ponto regido, o segundo do encontro, foi marcado às 4 horas e 19 minutos.» 
Não consta das crónicas o nome do marcador do golo. Sabe-se, apenas, que mereceu ser classificado de esplêndido e que para a sua marcação contribuíram Afonso e Carlos Vilar, Rankin e Paiva Raposo. Mas, segundo o «Diário Illustrado», parece que os postes das balizas não se encontravam à distância legal um do outro e que a trave não estava à devida altura. Sobre a equipa do Porto, um simpático comentário: «A equipa é de primeira ordem, distinguindo-se, todavia, Geock, que, quando na Escócia, era o seu primeiro guarda-redes.» Por especificar ficavam os nomes de outros jogadores porque o seu cronista, assumindo, humildemente, o pecadilho, aquiesceu não os «distinguir pelos nomes», apesar de saber e acentuar que um dos seus jogadores, «o mais novo dos Kendalls, tinha apenas 15 anos». O «Sport», salientando igualmente a prestação de Geock, mas também a de Artur Dagge e Mac Millen, vaticinava: «Se o grupo de Lisboa que, para o ano de 1895, tiver de defender a taça, não se treinar e não tiver muito cuidado na escolha dos jogadores que dele devem fazer parte, decerto bem difícil lhes será poder vencer o match, pois que, à equipa que vimos jogar pelo Porto, a única coisa que lhe notamos foi a falta de treinos, que, no que, estamos certos, não descurarão de futuro, a fim de poderem ganhar a taça, para o ano.»
Oito dias depois, em correspondência do Porto para Lisboa, «O Sport» publicava a seguinte notícia: «Depois do match entre Lisboa e Porto nada tem havido de notável no futebol. Apenas no domingo, 11 de Março, alguns sócios do Foot Ball Club do Porto estiveram no campo do antigo hipódromo de Matosinhos, treinando-se durante duas horas.»
De facto, entre os jogadores que representaram o F. C. Porto, no jogo contra Lisboa, estavam alguns dos que se treinaram pela primeira vez em Matosinhos, como jogadores e fundadores do Foot Ball Club do Porto: A. Nugent, Alfredo Kendall, Eduardo Kendall, Mac Kechnie e F. H. Ponsonby. Ou seja, mais um sinal que prova que o Foot Ball Club do Porto existia e jogava.
Foi, contudo, a última notícia publicada referindo-se de forma directa e inequívoca ao Foot Ball Club do Porto de António Nicolau de Almeida. - Fonte : A Bola,
A ideia do Rei D. Carlos foi de fomentar uma relação entre as duas cidades. A iniciativa não teve porém qualquer seguimento para além deste evento. Mal adivinhava D. Carlos no que estes embates se iriam tornar no futuro.

1.1    O FUTEBOL CLUBE DO PORTO, de Monteiro da Costa

Leia-se o que o 1º. Secretário da Direcção e fundador do FCP relata em 1926:
 in «O Tripeiro», 1 de Março de 1926, 3ª série, nº5 (113):
 «Por achar interessante vamos descrever como foi organizado nesta cidade o «Foot-Ball Club do Porto», o brilhante grupo desportivo que tanto tem honrado o nome da nossa terra.  Sentimos um grande contentamento em fazer esta descrição, não só pela honra que temos de ser um dos instaladores daquele Club, como também por evocarmos uma época saudosa da nossa descuidada juventude.
Existia, há trinta e tal anos no Porto O Grupo do Destino, composto de uma rapaziada alegre, ruidosa, entusiasta, buliçosa, cuja missão era divertir-se, após as horas de trabalho. Não havia local onde bem se comesse e melhor se bebesse que O Grupo do Destino não conhecesse! Rima e era verdade! Aquilo eram bons estômagos e bons gastrónomos! Partidas, piadas, blagues, bom humor, tal era o programa do Grupo do Destino. As suas festas marcavam pela originalidade e decorriam sempre cheias de grande entusiasmo! Com que recordações lembramos essa mocidade cheia de alegria e vivacidade!
Um dia o presidente do Grupo, isto pelas alturas de 1904 ou 1905, o saudoso José Monteiro da Costa, foi com seu pai visitar a Espanha, França e Inglaterra. Nas constantes epistolas que nos enviava, descrevia com muito entusiasmo um jogo de bola a que tinha assistido em Inglaterra e que logo que chegasse ao Porto nos daria algumas explicações a fim de também o jogarmos! Anunciada a sua vinda, um grupo de amigos sinceros, pois Monteiro da Costa de tudo era merecedor, foi esperá-lo a Ermesinde. Foi uma alegria doida a sua chegada. Monteiro da Costa até ao Porto descreveu rapidamente as impressões da viagem, tendo frases, as mais entusiásticas, para o tal jogo da bola que muito o interessava e que era nem mais nem menos que o foot-ball.
 Ouvi-lo e resolver que O Grupo do Destino organizasse um grupo de foot-ball foi obra de um momento. Os presentes já sabiam que com o que fosse resolvido todos concordavam; a divisa do Grupo era um por todos e todo por um.
Passados dias, realizou-se a reunião magna de todos os sócios para tratar do importante assunto - a instalação do grupo de foot-ball. Com as costumadas piadas, facécias, blagues, etc., apareceram de entrada dois óbices a resolver: - 1º o desconhecimento completo, por parte de todos os sócios, de tal jogo; 2º, a falta de dinheiro, pois, com toda a sinceridade o dizemos, a maioria dos sócios eram alegretes mas...pobretes!
Como se sabe, no Porto, o foot-ball era quase desconhecido. Somente existiam dois clubes onde se fazia esse jogo, que eram o Oporto Cricket e o Boavista Foot-Ball, aquele composto pela rapaziada das colónias inglesa e alemã, quase todos empregados nas diversas casas comerciantes estrangeiras desta cidade, e este pelo pessoal da fábrica Graham, à Avenida da Boavista. Estes clubes várias vezes se encontraram em desafios nos seus campos de jogos, mas a assistência era restrita às famílias dos sócios, razão porque era pouco conhecido entre nós. 
Havia alguns portuenses, poucos, que conheciam o foot-ball; eram aqueles rapazes que tinham estudado nos colégios de Inglaterra e Bélgica, onde aquele jogo era obrigatório. 
Os rapazes do Grupo do Destino desconheciam por completo o jogo de que se tratava, mas isso não os intimidou. Resolveram unanimemente organizar nesta cidade «o Foot-Ball Club do Porto». Estava resolvido o 1º óbice, pois diziam: dar pontapés na bola é facílimo!.... 
O que era desconhecer a técnica do foot-ball! 
Quanto ao 2º óbice - a falta de dinheiro – também tudo se conseguiu. O Grupo do Destino tinha resolvido apresentar no futuro cortejo, promovido pelo Club dos Fenianos, um carro carnavalesco e para esse efeito todos os seus sócios pagavam uma quota mensal. A assembleia magna resolveu que as quotas que se tinham pago para o carro carnavalesco fossem gastas com a instalação do «Foot-Ball Club do Porto» e assim os dois óbices apresentados no princípio da reunião desapareceram. O Grupo do Destino jamais deixava de levar a efeito aquilo que pensasse fazer! 
Foi logo nomeada uma comissão administrativa para dirigir os negócios do Club, ficando na presidência José Monteiro da Costa e como secretário o autor destas desataviadas linhas. 
Nessa ocasião foi também escolhida a cor da equipe, e, caso curioso, apesar da maioria dos sócios instaladores ser de republicanos - alguns até comprometidos nas conspirações - a escolha recaiu no azul e branco, pois eram as cores da bandeira nacional! 
Foi alugado um bocado de terreno da rua Antero de Quental, onde os sócios instaladores se iam treinando no jogo. Um dia apareceu no Club um italiano – Catulo Gadda – empregado na Fabrica Mariani, às Devesas, disposto a jogar. Foi recebido de braços abertos, pois era alguém que conhecia o foot-ball. Era um esplêndido defesa pelo pontapé forte que possuía. Já tínhamos dois «onze», mas pouco fazíamos. Pois se não tínhamos nascido para aquilo!.... 
Certa tarde andávamos no campo treinando-nos e alguém nos comunica que um cavalheiro desejava falar-nos. Fomos ter com esse cavalheiro e reconhecemos a vontade que tinha de nos ver jogar. Mostramos-lhe o pouco conhecimento que tínhamos de foot-ball e passados minutos o tal cavalheiro concordava que realmente ainda estávamos um pouco atrasados na técnica do foot-ball. Mr. Cassigne, ilustre súbdito francês, muito conhecido nesta cidade e que era o cavalheiro que desejou ver jogar, foi muito amável na apreciação que fez ao nosso jogo, pois não estávamos atrasados na técnica do jogo, estávamos atrasadíssimos!.... 
Conhecendo a boa vontade de Mr. Cassaigne, em prestar-nos os seus serviços, pedimos-lhe para tomar a direcção técnica do foot-ball, a que acedeu com todo o entusiasmo. Não fomos só nós os instruídos. Mr. Cassaigne, com toda a solicitude, instruiu também os rapazes do Colégio da Boavista, ao tempo pertencente ao falecido professor João Diogo, e instruiu os rapazes da Escola de Alunos Marinheiros, que se encontravam a bordo da Corveta Estephania.


Entrou para sócio o conhecido desportista Romualdo Torres, que imediatamente propôs também, entre outros, António Calém, Antunes Lemos, Ernesto Sá, Eduardo Villares, Nuno Salgueiro e António Campos que conheciam muito bem o foot-ball. 
E assim, com todos estes elementos, já se via aos domingos o campo – já agora com o tamanho que a regras indicavam – todo cheio de uma afluência que ali acorria para ver com todo o interesse as várias fases do foot-ball. Romualdo Torres, sempre disposto ao levantamento do Club, organizava constantes desafios com os dois clubes que existiam, o Oporto Cricket e o Boavista e assim o “Foot-Ball do Porto” iniciou a sua carreira auspiciosa.


Dos instaladores ainda são vivos, parecendo-nos, porém que nenhum é sócio, Amadeu Maia, jornalista; Cândido Pinto da Mota e Manuel Luís da Silva, despachantes oficiais; Joaquim Pinto
Rodrigues Freitas e Álvaro Osório da Silva Cardoso, industriais; António Moreira da Silva, Joaquim António Mendes Correia e António Baptista Júnior, empregados comerciais; Manuel Sacramento, armador, Joaquim Silva, negociante e o autor destas linhas.
E aqui está como um Club organizado por rapazes que ignoravam o que era o foot-ball tanta propaganda teem feito em prol do Foot-Ball!...».
Camilo Moniz, outro dos primeiros associados do FCP descreve (num “Boletim do FC Porto”) transcrito, em 1956, por José Rodrigues Teles, a fundação do clube. Em destaque (página 18): “E tais desejos (José Monteiro da Costa) manifestava de no seu regresso o pôr (ao futebol) em prática dentro do Grupo do Destino que os de cá já se sentiam jogadores do desconhecido jogo.” Outro (página 19): “Embora já existissem no Porto dois clubes que praticavam futebol, este jogo continuava a ser, por assim dizer, desconhecido em virtude desses clubes serem constituídos por ingleses e a entrada nos seus parques de jogos só ser permitida aos sócios e suas famílias. Um, o Oporto Cricket and Tennis Club, de que fazia parte a maioria da colónia inglesa e que ainda hoje existe no mesmo local, na rua do Campo Alegre; o outro, o Boavista Footballers Club, do Bessa, formado quase sempre na sua totalidade por empregados da Fábrica Graham e donde mais tarde nasceu o Boavista Futebol Clube, mas com o campo de jogo em sentido oposto ao actual.” E ainda outro (página 20): “O futuro Clube, dizia ele (José Monteiro da Costa) devia chamar-se «Futebol Clube do Porto», por os seus fundadores serem na sua quase totalidade tripeiros natos, a sua sede na cidade do Porto e o principal desporto a que se ia dedicar – o futebol.”


Foi então que António Nicolau d'Almeida falou a José Monteiro da Costa no projecto que iniciara em 1893. Este, prontamente, decidiu, sem hesitações acarinhar a ideia de Nicolau e adoptar o nome do clube por ele criado. Terminava o Grupo do Destino e nascia o FC Porto, em Agosto de 1906, assumindo desde logo uma faceta de clube eclético, no qual se praticavam também atletismo, boxe, Cricket, halterofilismo, pólo aquático e natação. De realçar, contudo, que a continuidade existe apenas no nome já que se trata, efectivamente, de um clube estruturado, com objectivos definidos, e de índole diferente. Como se vê a polémica sobre a data de fundação do Futebol Clube do Porto não faz nenhum sentido. A ideia é de Nicolau mas a fundação é de Monteiro da Costa, seu primeiro Presidente.


A equipa de 1906


José Monteiro da Costa

O seu primeiro campo, foi o Campo da Rua da Rainha, hoje Rua de Antero de Quental, 371. Junto à casa do refundador e presidente, na Rua da Rainha, havia um terreno alugado à Companhia Hortícola Portuense, do qual sobrava um espaço não cultivado. Decidiu-se aproveitá-lo, tendo Jerónimo Monteiro da Costa, pai de José, presidido à comissão instaladora. Construiu-se apenas um pequeno campo de 30x50 metros - o primeiro campo relvado em Portugal - mas ainda em 1906 os viveiros de plantas seriam transferidos para outro local, permitindo ao FC Porto criar um campo com as medidas oficiais rodeado de bancos para 600 pessoas e ainda uma pista de atletismo (para saltos e lançamentos), balneários e um bar.


As duas equipas F.C. do Porto e Real Fortuna de Vigo 

O FC Porto foi pioneiro também na internacionalização: foi a primeira equipa portuguesa a receber um conjunto estrangeiro, o Real Fortuna de Vigo, actual Celta de Vigo, em 1907, desconhecendo-se o resultado, e a primeira equipa a deslocar-se ao estrangeiro, a Vigo, em 1908. O primeiro título oficial do palmarés portista surge em 1912: é a Taça José Monteiro da Costa, o Campeonato do Norte de Portugal (de futebol), criado em homenagem ao “refundador” do FC Porto. 
Poucos meses depois da notícia da morte de Monteiro da Costa, o F. C. Porto recebe nova desfeita. Os proprietários dos terrenos avisaram o clube de que teria que abandonar o campo da Rainha. O ano de 1911 estava praticamente no fim. A nova direcção presidida pelo tenente Júlio de Lencastre começa imediatamente a procurar um terreno onde pudesse construir a nova casa portista. Encontra-o em Junho do ano seguinte. Ficava na Rua da Constituição, ali bem pertinho da Rua da Rainha, e tinha espaço suficiente para o campo de futebol, de ténis, a sede e muito mais. Decidiu-se imediatamente pelo aluguer do espaço. Ao preço de 350 escudos anuais.
Começaram de imediato as obras e a 29 de Setembro desse mesmo ano dá-se a mudança. A secretaria do clube começou a funcionar a 4 de Novembro num barracão mal acomodado. Em Maio do ano seguinte fica concluído um ringue de patinagem, uma iniciativa de um grupo de associados amantes da modalidade muito em voga nessa altura, que custearam as despesas e ofereceram as receitas ao clube.
Ainda que forçada pela construção de uma fábrica no espaço do antigo recinto, a mudança para o Campo da Constituição em 1912 correspondeu a uma significativa melhoria das instalações. Simultaneamente, o FC Porto crescia a nível desportivo, tendo vencido a primeira prova de âmbito nacional na história do futebol português: o Campeonato de Portugal de 1922.



O Futebol Clube do Porto, na Constituição em 1920 

O constante aumento do número de sócios e a introdução de novas modalidades (ginástica em 1910, basquetebol e hóquei em campo em 1926, râguebi em 1928, andebol de onze em 1932 e ténis de mesa em 1937), contribuíam também para o crescimento do clube. Em meados dos anos trinta o FC Porto conhecia uma dimensão tal que o Campo da Constituição já parecia pequeno demais - começaram então os planos para a construção de um novo estádio. Como este demoraria década e meia a surgir, foi necessário procurar uma solução temporária, passando o FC Porto a jogar alguns jogos no campo emprestado do Sport Progresso (Amial) ou do Académico (Estádio do Lima). 
Em 1945 o F. C. do Porto tinha cerca de 8 mil sócios e o alargamento a novas modalidades prosseguia: bilhar e pesca desportiva em 1940, voleibol em 1943, ciclismo em 1945, campismo em 1951 e hóquei em patins em 1955. Entretanto, a equipa de futebol passava 15 anos sem títulos, entre 1941 e 1955; eram as outras modalidades, nomeadamente o andebol de onze e o ciclismo, que se encarregavam de ir aumentando o palmarés do clube. O futebol, porém, mesmo não vencendo competições oficiais, foi responsável pela mais significativa adição à sala de troféus do F. C. do Porto na altura: em 1948 venceu o Arsenal, considerada a melhor equipa do mundo, no Estádio do Lima. Apesar de ter sido apenas um amigável, sócios e notáveis ofereceram ao clube um troféu com mais de 300 quilos, 130 dos quais em prata maciça.
O ansiado novo estádio foi inaugurado em 1952. Chamava-se Estádio do Futebol Clube do Porto, mas ficou para a história como Estádio das Antas. Inicialmente apenas um estádio, foi-se transformando ao longo dos anos num verdadeiro complexo desportivo, com a construção de uma piscina, dois pavilhões e outras instalações essenciais à prática das várias modalidades do clube.

 1.2 O ESTÁDIO DAS ANTAS 

Foi numa Assembleia Geral em 1933 que surgiu a proposta de construção de um novo estádio, já que o Campo da Constituição começava a revelar-se pequeno para o FC Porto. A proposta foi aprovada por unanimidade, mas só em 1937 começaram a ser tomadas medidas no sentido de concretizar o objectivo, com a criação de um empréstimo obrigacionista. Dez anos depois foi comprada uma área de 48.000 metros quadrados na zona das Antas, na parte leste da cidade do Porto. A primeira pedra foi lançada em acto simbólico em Dezembro de 1949, tendo a obra começado cerca de um mês depois.


José Bacelar, sócio nº1 do FC Porto na altura, pagou o salário do primeiro dia de trabalho a todos os operários. A solidariedade da população da cidade e da região para com o FC Porto ficou também marcada por dois cortejos de materiais, em que dezenas de camionetas, autocarros e furgonetas seguiram em cortejo para o estádio levando material de construção. 
Ao longo do processo foi necessário comprar terrenos adjacentes aos originais, pois concluiu- se que 48.000 metros quadrados não seriam suficientes para o complexo desportivo que o FC Porto pretendia construir. Comprados os referidos terrenos, a área total ascendeu aos 63.220 metros quadrados. A capacidade original do estádio era de 44.000 espectadores, distribuídos por três bancadas - duas superiores e uma lateral. O lado leste do campo não tinha bancada, sendo chamado de Porta da Maratona. 
No dia 28 de Maio de 1952 o Estádio do Futebol Clube do Porto foi inaugurado numa cerimónia pomposa que contou com a presença do General Craveiro Lopes, então presidente de Portugal. Urgel Horta presidia ao FC Porto na altura. Após a cerimónia foi realizado um jogo inaugural efectuado perante os rivais Sport Lisboa e Benfica. A partida terminou com a vitória do S.L. Benfica, por 8-2.

Ver, de meu tio António da Silva Tavares: https://www.youtube.com/watch?v=6u3Em92BMeI

O Estádio das Antas é obra dos arquitectos Oldemiro Carneiro e Aires de Sá e foi durante mais de meio século um monumento de referência da cidade e da região. Sonho persistente e acarinhado ao longo dos anos pelos adeptos azuis e brancos, cresceu com o tempo e implantou-se em definitivo na zona que lhe ofereceu o epíteto, já que a sua designação oficial era Estádio do Futebol Clube do Porto. Com o passar do tempo, mudou de aparência várias vezes, ganhando lugares e uma arquibancada, tal como o relvado rebaixado, e a zona envolvente dotou-se de campos de treino, pavilhões gimnodesportivos, piscina coberta, uma Sala de Bingo e, posteriormente, de uma renovada e ampliada área administrativa, que se instalou na emblemática Torre das Antas.

1.3 A POLÉMICA SOBRE A DATA DA FUNDAÇÃO


José Rodrigues Teles, portista e jornalista em publicações (por exemplo no jornal “Sporting”) da cidade do Porto e correspondente no Porto do jornal “Os Sports” (depois “Mundo Desportivo”) publicou duas histórias do FC Porto, onde ilustra, com rigor e paixão clubística, a fundação do seu clube. A primeira em 1933 e a segunda (por fascículos) em 1956. 
"António Nicolau d'Almeida fundou...o Futebol Clube do Porto, como a carta [a Guilherme Basto] assim nos indica. Da ligação ao Futebol Clube do Porto de 1893 e o que nasceu em 1906 já se tiraram, por certo, algumas conclusões, e outras mais podem surgir.(...) Também se sabe que António Nicolau d'Almeida, afinal, acompanhou os homens do Futebol Clube do Porto depois de 1906. Foi, portanto, um homem da nossa agremiação, aquele que primeiro a sonhou! (...) 
Glória e Vida de Três Gigantes - A Bola: "Em 1906, seria refundado por Monteiro da Costa, amigo de António Nicolau d'Almeida. Que se ligaria ao clube, acompanhando alguns dos seus amigos que, para além do nome, lhe mantivera a cor das camisolas (azuis e brancas) e a bandeira da Monarquia (...) alguns dos jogadores do Foot-Ball Club do Porto como Mackechnie, Nujent ou Kendall alinharam, no Foot-Ball Club do Porto refundado por Monteiro da Costa, em 1906".


Campa onde está sepultado José Monteiro da Costa, “Fundador e Primeiro Presidente do F. C. do Porto” no Cemitério de Agramonte, no Porto.

1.4 EMBLEMA ORIGINAL E EMBLEMA ACTUAL


O emblema original do Porto era uma bola de futebol azul com as letras FCP em branco. Assim continuou até 1922, quando Augusto Baptista Ferreira, jogador do “time”, resolveu unir o símbolo do clube ao brasão da cidade do Porto. Simplício, como era conhecido, criou assim o escudo do Futebol Clube do Porto. Data da mesma altura o Hino do FC Porto, com letra de Heitor Campos Monteiro e música do Maestro António Figueiredo e Melo.


Após o Cerco do Porto e a morte de D. Pedro IV, por decreto redigido por Almeida Garrett e promulgado por Passos Manuel, a 14 de janeiro de 1837, D. Maria II outorgou novas armas ao Porto, em especial reconhecimento pelo papel decisivo da cidade no triunfo do liberalismo em Portugal. 
“Para memória de que a cidade do Porto bem mereceu da pátria e do príncipe, serão as suas armas um escudo aquartellado, tendo no primeiro quartel as armas reaes de Portugal; no segundo as antigas armas da mesma cidade, e assim os contrários; e sobretudo, por honra, e em recordação do legado precioso que de meu augusto pai recebeu, um escudete vermelho com um coração de oiro; coroa ducal; e por timbre um dragão negro das antigas armas dos senhores reis d'estes reinos; com a tenção em letras de oiro sobre fita azul - Invicta: - e em roda do escudo a insígnia e collar da gran- cruz da antiga e muito nobre ordem da Torre e Espada, do valor, lealdade e mérito.” – Cf. decreto redigido por Almeida Garrett e promulgado por Passos Manuel e D. Maria II em 14 de Janeiro de 1837. 
A coroa ducal deveria ter sido encimada por uma serpes alada, símbolo da Casa Real. Desde fins do séc. XIV o Rei de Portugal encima o seu elmo com uma serpe alada, de ouro, emblema que tinha sido dos Lusitanos, uma figura totémica, portanto. Talvez por influência cultural inglesa, (Almeida Garrett esteve refugiado em Inglaterra) a serpes passou a dragão, o dragão de S. Jorge, nos tempos de D. Maria II. Estas armas do Porto desenhadas por Almeida Garrett, reflectem o contacto com o Romantismo inglês, onde Garrett se exila, e daí a procura de alguns elementos medievais. No brasão de Portugal, a partir de D. João I, consta a serpes alada e não, como ingenuamente pensou Almeida Garrett, “o dragão negro das antigas armas dos senhores destes reinos”.


O Leão de Espanha derrota a Serpes de Portugal (Gravura de Eramus Quellinus – 1607/1678, pintor discípulo de Rubens)
S. Jorge tinha acertado a cabeça do dragão com sua poderosa espada Ascalon, sendo o dragão a representação do demónio! O dragão vai ser, de facto, representado a verde, e no seu pescoço será colocada uma fita com a palavra Invicta, título que D. Maria II, primeiro duque do Porto, atribuiu à cidade.
Na Ora Marítima de Avieno meditada por Mendes Corrêa no seu opúsculo "Le Serpent, Totem Dans La Lusitanie Proto-Historique", afirma-se que a tribo dos Saefos habitava os montes do interior do território nortenho português e adoravam as Serpentes, as Serpes. Diz Pinharanda Gomes que "a serpente apresenta-se como símbolo do conhecimento global - a serpente enrolada, aboca tocando o rabo, denomina simbolicamente o universo do saber, a unidade do ser". Com o Estado Novo será criado para a cidade do Porto um novo brasão. Contudo, encontraremos, ainda, a serpes nos brasões de Coimbra, Vila do Bispo e Serpa.
Também o hino do F. C. Porto refere as armas da cidade:

“Oh, meu Porto, onde a eterna mocidade 
Diz à gente o que é ser nobre e leal.
Teu pendão leva o escudo da cidade
Que na história deu o nome a Portugal. “

quarta-feira, 27 de abril de 2016

FAZENDAS QUE SE EXPORTAM PARA O NORTE - III

6.8.3 – Fazendas que se exportam para o Norte



“Nos meados do século XIX entre os ingleses exportadores de vinhos a atmosfera era de prosperidade empreende-

In O Tripeiro, Série V


Mapa do Rio Douro desenhado pelo Barão de Forrester


Mapa da região demarcada do Douro desenhado pelo Barão de Forrester em 1848.


O Barão de Forrester (1809 – 1861), cidadão inglês, veio para o Porto em 1831 para a empresa de vinhos de um tio. Estudou, escreveu e desenhou a Região Demarcada do Douro, tendo desenhado “ um minucioso, interessante e notável mapa de todo o curso do rio, desde a fronteira espanhola até ao Atlântico; outro da Região Vinhateira; um terceiro do leito e margens do Douro, mostrando os rápidos e as formações geológicas; e um quarto, do Oidium Tuckeri, essa característica e nauseabunda doença contraída pelas vinhas do Douro” (O Tripeiro V série, Ano II).


Viveu as lutas liberais, esforçando-se por não tomar partido por qualquer dos lados, e servindo de mediador entre os dois contendores. Lutou pela pureza do vinho do Porto, numa altura em que os ingleses o adulteravam usando em excesso água ardente, baga de sabugueiro e açúcar. Foi o primeiro inglês a apoiar a criação da Companhia. Foi feito Barão por D. Fernando II quando este era regente.
Em 12 de Maio de 1861, ao atravessar de barco o cachão da Valeira este virou-se, tendo sido arrastado para o fundo devido a um cinto (ou, para alguns as botas) com moedas pesadas que trazia 
Neste mesmo barco seguia a D. Antónia Adelaide Ferreira, “A Ferreirinha”, que se terá salvado por usar uma saia de balão que a levou até à margem.
Sobre este desastre damos pormenores no nosso lançamento de 4/9/2015 - De Barca d'Alva ao Cachão da Valeira.




Legenda: "Interior de um armazém de vinho do Porto, em Gaia, na primeira metade do século XIX.
Segundo um desenho original de J.J. Forrester.

Segue-se um extraordinário texto jornalístico que mostra bem a inteligência, administração e interesse pelos seus trabalhadores do Barão de Forrester:
(30 de Agosto de 1854) - “Sabendo que o Sr. Forrester tinha estabelecido no seu armazém da Ermida em Vila Nova de Gaia um caminho-de-ferro por onde girava um carro acelerado construído convenientemente para o serviço das vasilhas, levado pela curiosidade que nos promovera objecto tão novo, fomos à morada do Sr. Forrester; e seguro da dignidade que caracteriza este cavalheiro solicitamos de S.Sª o mostrar-nos o seu armazém e a permitir-nos presenciar o trabalho pelo seu novo sistema. Não tínhamos a honra de contar-nos na tratabilidade do Sr. Forrester, e o nosso título de apresentação não passava do desejo, que assistia a uma pessoa, quase desconhecida deste patriótico comerciante. Faltávamos a um rigoroso dever se deixássemos de patentear como fôramos recebidos pelo Sr. Forrester, e pelo seu digno filho, da maneira que mais podia lisonjear-nos. Ss.Sª tiveram a nobre franqueza de mostrar-nos todo o seu estabelecimento, dando-nos civilizada e agradavelmente as necessárias explicações tendo nós a ocasião de ver que o novo mecanismo, que o Sr. Forrester apropriara ao seu armazém, aponta a passagem para o progresso naquela qualidade de trabalho. O armazém de um comprimento de perto de 500 palmos, é cortado no centro por uma linha férrea das dimensões usadas nos caminhos de ferro ordinários. Por esta linha, que separa os seis rumos, que comporta a capacidade do armazém, percorre o carro acelerado pelo impulso, que pode dar-lhe a força de um ou mais homens conforme a necessidade o exija. Este carro mandado construir de propósito na Inglaterra debaixo da inspecção do Sr. James, filho do Sr. Forrester, compõem-se de dois corpos, estando num deles colocado um guindaste, que levanta as pipas ou para o 2º ou 3º corpo, a fim de serem transportadas para o ponto que se queira ou para a altura do lote, a que seja necessário eleva-las. O serviço assim feito substitui o trabalho pelo menos de três quartas partes dos homens, que se empregavam e empregam no sistema antigo. As lotações e os benefícios fazem-se com tal celeridade que a grande conveniência do carro e do guindaste se torna evidentemente palpável. Para quem nos outros armazéns presencia a fadiga dos trabalhadores para fazer rolar as pipas levando-as a qualquer ponto determinado através do custoso impulso das mãos, vendo-as rojar pelo pavimento térreo com manifesta deterioração de todos os elementos, que as compõem, além dos grandes balanços, que o líquido sofre dentro da vasilha, estorvando a sua pronta depuração, não pode deixar de maravilhar-se que o Sr. Forrester achasse o segredo de acabar com estes inconvenientes tornando o serviço mais suave e reconhecidamente mais proveitoso para as vasilhas e líquidos armazenados. Para mais satisfazermos nossa curiosidade quisemos experimentar a impressão do movimento do carro através do carril de ferro, e com os nossos companheiros fizemos a carreira de toda a linha e fôramos perfeitamente surpreendidos, podendo fazer ideia, se bem que aproximada, do trânsito das locomotivas nas vias férreas, de que só temos visto a descrição. (ainda não havia comboios em Portugal). Seria bem para desejar que os comerciantes de vinhos seguissem o exemplo do Sr. Forrester, aproveitando os grandes resultados, que a ciência da máquina oferece ao trabalho, dando assim uma prova de que os adiantamentos daquela ciência não passam infrutíferos para nós. Além da inovação do caminho-de-ferro, e do carro, que por ele percorre, que não pode alcançar todo o serviço a fazer no armazém, o Sr. Forrester introduziu no trabalho, que dirige, pequenos carros de mão adequados aos misteres. Oshoptrucks servem especialmente para transportar os cascos vazios, demandando apenas a pequena força de um rapaz. Uns de quatro rodas baixas, que se empregam na condução das pipas cheias para qualquer dos pontos dos terceiros rumos pelas diferentes coxias do armazém: e outros mais pequenos, que servem unicamente no trânsito ao vinho engarrafado, tendo a vantagem, além de se moverem com facilidade, serem construídos de modo tal, que a quebrar-se alguma das garrafas o vinho é recebido num depósito e aproveitado. Não há só a notar no armazém do Sr. Forrester as inovações, que deixamos mencionadas: além delas, a regularidade na colocação de todos os objectos para que apareçam de pronto quando necessários, concorre também muito para a singularidade do estabelecimento. As ferramentas e demais utensílios são todos no possível esmero do trabalho, não podendo deixar de promover um vantajoso resultado nas operações. Os utensílios, que se destinam à depuração das borras, são tão engenhosamente concebidos que produzem uma notável disparidade, comparados com os do sistema nos outros armazéns seguido. Os armazéns de Vila Nova não sendo de construção subterrânea, como o são em outros paises para ministrar aos líquidos a frescura de que necessitam, precisam de ser continuamente refrescados com água. Para esse refresco mandou o Sr. Forrester vir e emprega no seu armazém a bomba chamada force-pump, que o refresca e ao mesmo tempo as vasilhas que nele se acham, servindo também para bomba de incêndio. Para estimular os sentimentos dos trabalhadores e infundir-lhes os preceitos da moralidade, que devem guiar o homem em qualquer posição, que se encontre, o Sr. Forrester mandou escrever na porta do armazém os dois preceitos que devem dirigir a conduta dos operários - O mérito será premiado - o vício será punido - Praticando estas duas saudáveis máximas, o Sr. Forrester todos os sábados recompensa monetariamente o trabalhador ou trabalhadores, que de recompensa se tornem dignos durante a semana. Ao lado do armazém está a tanoaria, descobrindo-se nela o mesmo sistema de regularidade. O alimento dos trabalhadores é preparado em comum a troco de uma diminuta parte do salário a qual não excede a vinte réis diários, tendo assim aqueles por uma insignificante quantia um rancho excelente, muito mais barato e abundante do que o teriam feito por conta de cada um em particular, resultando, além desta vantagem do trabalhador a do Sr. Forrester que nos disse não prejudicar-se e conseguir para o trabalho o tempo que cada trabalhador perdia com o seu arranjo particular de comida, que pelo sistema adoptado se faz convenientemente por dous aprendizes da tanoaria ou do armazém. Os aprendizes não concorrem para o rancho, que o Sr. Forrester lhes manda ministrar gratuitamente, concedendo-lhes de mais quatro horas por dia para poderem ir à escola. O Sr. Forrester leva tanto a empenho de interessar os operários no seu estabelecimento que ele próprio vigia a cozinha, procurando por todos os modos que o rancho seja tanto quanto ser possa agradável aos trabalhadores. O vinho dado de bebedagem é dado regradamente; mas na precisa abundância, não sendo negado de modo algum, quando o exige o cansaço do trabalho. A economia na despesa é um feliz resultado de todas as combinações, em que a experiência do Sr. Forrester assentou o seu novo sistema. É assim que a boa práctica de administrar pode reunir as reciprocas vantagens do trabalhador e do dono do armazém. Parece-nos que devíamos a nossos leitores a descrição do que viramos, pois que ela não será indiferente a parte deles, que na especialidade se empregam no importante ramo do comércio do vinho.” In blog A Porta Nobre


Real Companhia Vinícola do Norte de Portugal – acção de 100.000 reis – 1887



Palacete Ferreirinha no Largo da Trindade - Estes prédios foram destruídos, excepto o primeiro à esquerda, par a construção do Palácio dos Correios, ao lado da C. M. do Porto

“Falar do Vinho do Porto e do Douro sem falar de D. Antónia é quase impossível. Personagem da vida do Douro e do Vinho do Porto, conhecida por "Ferreirinha", nasceu na Régua em 1811. Mulher determinada e corajosa, construiu um enorme império durante o século XIX.
Era uma pessoa que gostava de ajudar os mais pobres, que teve a coragem de desafiar homens poderosos e serviu de exemplo e orgulho das gentes Durienses.
A história dos Ferreiras começa com Bernardo Ferreira, proprietário no Douro, que sob pena de prisão foi obrigado pelo Marquês de Pombal a cultivar umas terras denominadas de Montes de Rodo, convertendo-as em bonitas quintas. Com este tipo de medidas, não muito correctas, o Marquês de Pombal conseguiu que muitos proprietários aumentassem os seus bens agrícolas. Foi morto pelas tropas de Napoleão, pois estas confundiram-no com um desertor, quando lhes dirigiu a palavra num impecável francês. Deixou 3 filhos, José, António e Francisco. José e António tiveram respectivamente uma filha, Antónia Adelaide, e um filho, António Bernardo, que casaram em 1834. Deste casamento têm 3 filhos, Maria d`Assunção (mais tarde condessa de Azambuja), um rapaz, de seu nome António Bernardo, e Maria Virgínia (tendo morrido em menina). D. Antónia ficaria viúva com apenas 32 anos e voltaria casar em 1856, durante o seu "exílio" em Londres, com Francisco José da Silva Torres. Após a morte do seu primeiro marido, a coragem desta senhora não pára: fez grandes plantações de vinha no Douro, obras de benfeitoria, contratou colaboradores, construiu armazéns, comprou quintas importantes (Aciprestes, Porto, Mileu) e fundou outras, como o Monte Meão, tornando-se figura de primeira grandeza. Tão importante que o Duque de Saldanha (um dos homens mais poderosos do seu tempo) pretendia casar o seu filho com a menina Maria d`Assunção. Após recusa de D. Antónia, o Duque, habituado a não ser contrariado, manda os seus homens raptar a menina de apenas 12 anos. Ao saber da estratégia do Duque fogem para Espanha e depois para Inglaterra onde se refugiam. Na sua ausência seria Joaquim Monteiro Maia, seu colaborador, que tomaria conta do negócio. Em 12 de Maio de 1861, quando descia o rio na zona do Cachão da Valeira e após naufrágio do barco onde seguia, assiste à morte do seu amigo o Barão de Forrester. O ano de 1868 foi um ano excelente, as qualidades de vinho eram enormes e os viticultores não conseguiam vender o seu vinho. D. Antónia compra enormes quantidades de vinho para ajudar os agricultores na luta contra os baixos preços praticados pela abundância de vinho. Dois anos mais tarde surge a praga do oídio que destrói quase a totalidade dos vinhedos, atirando os Durienses para a miséria. Mulher com uma capacidade enorme de negociar, pôde com alguma facilidade negociar com os ingleses todo o seu vinho que permanecia nos armazéns, contribuindo, assim, para um enriquecimento da casa Ferreira.
Em 1880 fica novamente viúva mas este seu descontentamento não a impossibilitou de continuar a obra de benfeitoria que havia começado, com os hospitais de Vila Real, Régua, Moncorvo e Lamego. D. Antónia é sem dúvida uma das maiores, se não a maior, personagem na história da região do Douro e do Vinho do Porto. Faleceu em 1896, aos 85 anos, na Casa das Nogueiras (Quinta das Nogueiras). O Douro perdera a sua Rainha. Actualmente a A. A. Ferreira, considerada uma das mais importantes casas de Vinho do Porto, já não faz parte da Família, tendo sido vendida em 1987 ao grupo Sogrape. Continua, contudo, a entregar anualmente o "Prémio Dona Antónia", destinado a distinguir as mulheres que mais se evidenciaram no mundo empresarial português.
Autor: Abílio Forrester Zamith - 
In Guia do Vinho do Porto, Chaves Ferreira - Publicações, S.A”.




Vinho com quinino - era exportado para o Brasil

domingo, 24 de abril de 2016

FAZENDAS QUE SE EXPORTAM PARA O NORTE - II

6.8.2 – Fazendas que se exportam para o Norte


In História do Porto –Luis Oliveira Ramos


In História do Porto – Luis Oliveira Ramos



Cais de Gaia - 1950
Sobre os armazéns e exportação do vinho do Porto trataremos posteriormente em pormenor.





O sumagre vinha do Alto Douro e era usado como tempero, tratamento de couros e peles e no tingimento de tecidos e fios. Nos meados e finais do século XVII o valor do sumagre transaccionado no mercado portuense para uso interno e exportação chegava a suplantar o próprio valor do comércio do vinho!


In site côavisão

Estudo sobre o sumagre


Colhendo cortiça na Quinta do Romeu




O maior exportador de cortiça do Douro foi Clemente Meneres, da sua quinta do Romeu. Tinha armazéns no prédio do antigo Convento de Monchique e guardava a cortiça sobre o telhado.

Público – exportação de cortiça – 25/2/2013 



In História do Porto – Jorge Fernandes Alves


In Portugal Antigo e Moderno - 1875



Transporte de pipas de vinho – Gaia – 1905


Saindo de um armazém de vinhos em Gaia - 1910


Armazéns de vinhos Hutcheson em 1927 – são de 1881 - ao fundo palacete Condes das Devesas, hoje em total destruição.


Construído em 1843, em estilo neoclássico, para servir de sede ao Banco Comercial do Porto, o edifício foi adquirido, em 1933, pelo Instituto dos Vinhos do Douro e Porto.



Este túnel, feito para passagem do comboio de Gaia ao Porto, nos anos sessenta do século XIX, foi abandonado e construído um outro mais à esquerda que o substituiu. A Real Vinícola passou a utiliza-lo como armazém dos seus vinhos.