segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

CONVENTOS DE RELIGIOSAS - II

3.12.12 – Convento Corpus Christi das Dominicanas - II


Crucifixo do séc. XIV que se encontra no coro de baixo – foto de Gaspar de Jesus

Conta-se que nesta zona do Porto houve há séculos uma epidemia de peste. Com receio de serem contagiadas algumas freiras deixaram o convento e refugiaram-se noutro. Três, porém, decidiram ficar onde estivesse este crucifixo pois por ele tinham uma grande devoção, acreditando que seriam protegidas. As freiras que saíram foram atingidas pela peste e muitas morreram, enquanto àquelas nada de mal lhes aconteceu. 
Durante o cerco do Porto o convento ficava entre as baterias dos contendores pelo que, as freiras, tiveram de fugir para Arouca e Vila do Conde.


Janela central do Coro Alto que dá para a capela – foto Gaspar de Jesus


Coro Alto - o grande interesse patrimonial situa-se no coro alto, encomendado pela Princesa Catarina, filha de D. João IV e depois rainha de Inglaterra, em 1680. Ao fundo as imagens de Nossa Senhora da Conceição, do séc. XVIII e S. Domingos, do séc. XIV.


Tecto do Coro Alto – foto blogue calcorreandooporto - O tecto é todo coberto por 49 caixotões pintados, dos quais os 15 do centro representam os mistérios do Rosário. Os restantes representam santos dominicanos e outros que não pertencem à Ordem, mas que se enquadram na espiritualidade da época, destacando-se três devoções principais - o Santo Rosário, o nome de Jesus e a Eucaristia.


Foto blogue rgpsousa


Pormenores do Coro Alto – foto Gaspar de Jesus


Pormenor do cadeiral – foto Insitu

“No interior, destaque para o cadeiral do coro em talha, que remonta à segunda metade de seiscentos, onde sobressai a expressividade de determinadas máscaras e animais. A pintura e a imaginária que decoram a igreja (tecto do coro alto, espaldar do cadeiral e retábulos), apresentam uma iconografia que se enquadra nas temáticas da Ordem”. Rosário Carvalho
Visitámos este convento há cerca de 10 anos tendo-o encontrado muito abandonado e as pinturas do coro alto em muito mau estado. Voltámos lá após as recentes obras de recuperação e verificámos que esta foi muito bem executada, pelo que aconselhamos uma visita.


Estiveram aqui sepultadas D. Leonor de Alvim, esposa do Condestável D. Nuno Álvares Pereira, e sua avó, D. Maria Mendes Aboim, falecida em 1355, fundadora do convento; também se encontra aqui a arca tumular de Álvaro Anes de Cernache, primeiro senhor de Gaia, que foi alferes da bandeira da Ala dos Namorados na batalha de Aljubarrota (1385) e falecido em 1442.
Foto de Castelo Vila


Era costume, em certos conventos femininos, realizarem-se, em dias de grande festa, os chamados Outeiros, em que convidados e conhecidos mostravam às meninas recolhidas e freiras os seus dotes de improvisação poética. Após graças e boa disposição, era servido pelas freiras uma refeição com os melhores doces da casa; e diga-se que habitualmente eram os melhores da cidade.

Em 1848 houve um neste convento onde o poeta satírico Faustino Xavier de Novais foi concorrer. Tinha ido num velho carroção. À entrada, berra para as grades onde estavam vultos femininos;

Seis patuscos qual mais ratão
À custa de seu dinheiro
Chegam agora ao Outeiro
Metidos num carroção.
Trouxe sempre os bois a trote,
Que sem darem um pinote
Aqui põe os vates prontos:
Portanto nada de contos
Oh! Meninas, venha o mote.

De imediato lhe foi lançado o seguinte:
Negro zelo vai-te embora.
Em voz alta, recitou:

Vou aprender a torneiro
Que é ofício muito bom;
Trabalha o pé e a mão
Ganha-se muito dinheiro;
Vou comprar a um ferreiro
Um torno, mas dos de fora,
Porém, lembra-me agora
Tenho aqui um tornozelo;
Fica o torno e digo ao zelo
Negro zelo vai-te embora. 

Entra em cena o segundo vate, o Pároco de Mafamude, José Maria de Sant’Ana e Silva, e diz:

Eu não quero marmelada, 
Tão pouco doces, licor
Venho aqui por favor
Não quero me dêem nada.
Quero sim ver acatada a musa do trovador;
Eu cá não sou impostor
Ás madres digo o que sinto:
São mudas nesse recinto?
Louvado seja o Senhor!

Alguém lançou outro mote:
Amor é a alma da vida
Glosou o poeta:

Olhem que amor não é cego
Vê um mosquito na Lua
É um lampião de rua
É firme como um prego
Em que a gente anda pendida.
É amor uma torcida
É amor um parafuso
E sendo ele em bom uso
Amor é alma da vida.

Uma bela história, ligada ao Corpus Christi, que encontrámos em O Tripeiro, Volume 6:

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