segunda-feira, 21 de setembro de 2015

RIO DOURO - VII

6.1.7 - De Entre-os-Rios a Valbom



Entre-os Rios – foto de A. Leitão

O domínio sobre o rio Douro constituiu, desde a proto-história, uma característica que fez de Entre-os-Rios um local privilegiado para implantação de habitações. Vestígios de uma muralha de um castro e registos da descoberta de cerâmica romana tardia são provas da ocupação do território.
A região assume uma elevada importância estratégia durante a Reconquista Cristã de D. Afonso III das Astúrias.



As Franciscanas Clarissas instalaram-se no séc. XIII num pequeno convento em Torrão, Entre-os-Rios. Considerado um local perigoso pelas incursões castelhanas, pediram à rainha D. Filipa de Lencastre que as autorizasse a construir um novo convento no Porto, no lugar dos Carvalhos do Monte, o que lhes foi autorizado por D. João I. 
As freiras mudaram-se em 1427 e a igreja foi concluída em 1457. 
Este convento começou com as 7 freiras que residiam no de Entre-os-Rios.




A Procissão das Endoenças faz, na Sexta-Feira Santa, o percurso inverso do dia anterior (5ª. Feira). Sai da Capela de S. Sebastião (Calvário) em Entre-os-Rios e dirige-se, atravessando o Rio Tâmega, para a Igreja de Sta. Clara na vizinha Freguesia do Torrão (Marco de Canaveses), onde existiu um convento que deu origem ao de Santa Clara do Porto. Tradição Centenária que perdura até os dias de hoje com a Fé de muitos fiéis.



Capela Mor


A Igreja de São Miguel ergue-se de um pequeno planalto, ilustrando a importância estratégica do local onde foi erigido este monumento românico tardio.
A primeira vez que a Igreja de S. Miguel é referenciada em documentos é no Livro de Testamentos de Paço de Sousa, datado de 1095, no qual é referida uma doação de parte da Igreja ao Mosteiro. Outro documento, de 1120, dá notícia de uma nova doação de parte da Igreja ao Mosteiro.
A arquitectura românica tardia que exibe situa a sua construção após o século XIV, ou seja, o edifício original terá sofrido profundas remodelações ao longo do tempo.
Os especialistas consideram que, quando o edifício foi erigido, há muito o centro decisório regional havia deixado Eja, facto explicado pela modéstia da construção: templo de nave única e capela-mor quadrangular mais baixa e estreita que o corpo; alçados escassamente fenestrados e destituídos de pormenores decorativos relevantes; fachada principal de escassa volumetria, rasgada por portal de arco apontado a que se sobrepõe pequena fresta; arco triunfal igualmente apontado, decorado sumariamente com motivos geométricos e vegetalistas.
A Baixa Idade Média e a Modernidade deixaram poucas marcas na Igreja, o que não sucedeu na época Barroca, durante a qual foi renovado o altar, com colocação de talha dourada, de estilo nacional, seccionado por três arcos de volta perfeita.
No século seguinte, as obras de actualização estética continuaram, edificando-se o coro-alto e introduzindo-se os retábulos laterais.

Do Porto a Entre os Rios – Cinemateca Portuguesa - 192?



A Máquina que percorreu o trajecto da Boavista a Matosinhos, via largo de Cadouços, foi vendida para a linha de comboio que ligava Entre-os-Rios, Penafiel e Lixa.

Entre os Rios – 1922 – Cinemateca Portuguesa


Devido à sua situação geográfica, junto ao Rio Douro, Valbom foi durante gerações um importante centro de pesca artesanal, efectuada a bordo dos tradicionais barcos "valboeiros". O seu barco típico ainda existe, mas, a actividade piscatória desta terra desapareceu, após a introdução da pesca de arrasto, por barcos de calado superior. Hoje, a marcenaria, a ourivesaria, a talha em madeira e os embutidos predominam na economia local.
Valbom foi elevada a cidade em 9 de Dezembro de 2004.
Hoje passou à União das freguesias de Gondomar (S. Cosme), Valbom e Jovim. 


Igreja Paroquial



Festas de S. Pedro


Barco de Passagem


Bateira de pescador – 1900


Valboeiro pronto para a pesca


“Esta curiosa embarcação da zona de Valbom podia navegar tanto no rio como no mar. Apesar de serem usadas na pesca também faziam transporte de mercadorias e passageiros entre margens. Para protecção e conforto dos passageiros utilizavam um pequeno abrigo denominado de camareta. Conforme a sua utilização, quanto à carga chamavam-nos de barco das padeiras e barco das toucinheiras. Uma tripulação de 2 a 3 homens era o suficiente para governar esta embarcação de cerca 18 metros. Armavam uma pequena vela de carangueja num mastro bem avante e tal como os Rabelos tinham um remo de pá longo em vez de leme. O fundo é constituído por uma única tábua - a cal - é completada por uma ou duas tábuas já inclinadas, os fundos. Funciona como barco de pesca - o saveiro - barco de rio e mar ou barco de carga e transporte de passageiros. Como saveiro era o barco utilizado na pesca do sável e media cerca de 6,8 metros. Podia ser, todavia, utilizado, também, como barco de carga. Adoptavam um sobrecéu quando se destinavam às padeiras de Avintes ou ao passeio ao longo do rio. Como barcos de passagem para a travessia entre Gondomar e Gaia, eram, por vezes, conduzidos pelas barqueiras e mediam cerca de 7,5 metros. Neste caso o rebordo falso é calafetado e munido de um resguardo para evitar a entrada da água. Podiam ter também coqueiro. Hoje, apenas, Pé-de-Moura, Esposade e Ribeira de Abade permanecem baluartes destes barcos. Quem constrói estes barcos? Para construir estes barcos havia artesãos especializados. Hoje, esta arte está a cair em desuso. No entanto, em Melres, o senhor Manuel Joaquim Moreira de Sousa, mais conhecido por Nelito do Sr. Albertino, actualmente com 43 anos, ainda faz Valboeiros ou outro tipo de barcos. Afirma que esta actividade é financeiramente compensadora, por isso se admira de não haver quem queira aprendê-la. Talvez, porque hoje tudo é facilitado, já que ele como aprendiz tinha que ir de casa em casa à procura de trabalho e nada ganhava com isso. Hoje, tem o seu estaleiro em Vilarinho, Melres e apesar da tarefa trabalhosa, não tem mãos a medir. Nesta arte notabilizou-se um outro artesão, Mestre Arnaldo, falecido já na casa dos oitenta anos. Arnaldo Pereira nasceu em Vilar do Andorinho, Vila Nova de Gaia, a nove de Março de 1911, numa família tradicionalmente construtora de barcos. O bisavô ensinou a arte ao avô e este ao pai que transmite o saber a Arnaldo. Assim, aos treze anos já ajudava o pai na construção de barcos. Com ele ia por Crestuma, Pombal, Lixa, Carvoeiro, Melres e até Entre-os-Rios. Aos dezoito anos construiu o primeiro Valboeiro. Estabeleceu-se em Melres a construir barcos e fez desta arte a sua ocupação até morrer. Participou em inúmeras feiras de artesanato a fim de dar a conhecer os barcos que saíam das suas mãos. 
A pesca no rio Douro: a importância da pesca nesta região vem de tempos longínquos. Os Fenícios comercializavam o peixe salgado e os Romanos, a partir do séc. I I, a conserva de peixe - garum. Em tempos medievais os Senhores preocuparam-se em legislar sobre a cobrança de impostos sobre o pescado, como pode ser exemplificado no foral de Gondomar. Só em 1843 vão ser substituídos todos estes impostos de pesca devidos aos senhores pelo pagamento ao Estado de 6% dos lucros dos pescadores, que em 1928 passa para 8,3% do valor do pescado. A preocupação de regrar a pesca do ponto de vista ecológico, vai, também, ser constante. Desde muito cedo, são redigidas leis nesse sentido. Por exemplo, os "Acórdãos da Câmara do Porto" de 1560 e 1561 estabelecem o tipo de malhas permitidas e proíbem certas redes (mossas e covãos nos meses de Março a Maio, excepto para os sáveis, bogas e tainhas e com redes varredouras, tresmalhos e galritos dobrados) bem como proíbem a poluição das águas com trovisco, barbasco, coca ou cal. No entanto, a provar que a prevaricação é constante o Decreto de 16 de Setembro de 1886 volta a proibir os mesmos métodos e redes. As penas consistiam em prisão de três a trinta dias e correspondente multa. Quanto ao peixe pescado o foral de Gondomar refere a Lampreia, Sável, Solha e Irez (eiró - espécie de enguia). Hoje, ainda é possível pescar enguia, barbo, boga, escalo, tainha, mugem, ruivaca, alguma lampreia e sável”. In site O Valboeiro


A Fundação Júlio Resende, também conhecida por "lugar do desenho" foi criada a partir de um espólio de mais 2000 desenhos do mestre, mostra permanente (exposição do Acervo). Exposições temporárias, conferências, concertos e outros eventos.

Fundação Júlio Resende


Guerra da Patuleia – civil a ser vergastado por militares


Um dos pontos de referência da cidade é a Casa Branca de Gramido (Valbom) de grande conotação histórica, já que neste local foi assinada a Convenção de Gramido, em 1847, que pôs fim à Guerra da Patuleia.


O artesanato está aqui fortemente implantado, através da ourivesaria e marcenaria, sendo famosos os trabalhos em filigrana e talha em madeira, além das curiosas esculturas em raízes de árvores.


“Uma mesa larga de granito, ladeada por dois bancos e enca­beçada por outro mais alto, atrás do qual se ergue majestoso e frondoso um velho sobreiro. Gravada na pedra da mesa encontra--se a data de 1742, ano em que a Pedra da Audiência no lugar de Quintã foi erigida. Único monumento do género em Portugal, foi por decreto de 20 de Agosto de 1946 classificada, com o seu inseparável sobreiro, imóvel de interesse público. 
Antes de existir a Pedra da Audiência, os julgamentos ter-se--iam efectuado nas igrejas e mais tarde nos adros e pousadouros a partir de 1724 passam a realizar-se ali. No entanto, Avintes aspira a uma casa do concelho e é então que, por volta de 1830, o pro­curador da freguesia e couto de Avintes apresenta às instâncias superiores o seguinte pedido: 
"Diz Joaquim Pinto Aleixo, actual Procurador da freguesia e couto de Avintes, que havendo no dito couto um Juiz Ordinário, com Procurador e seu Escrivão e Oficial de Jurado, tendo o dito Juiz obrigação de fazer Audiência de 15 em 15 dias às Partes, não ha casa, vulgarmente chamada do concelho, para n'ela se fazer audiência às Partes, havendo para o destino da Audiência uma pedra em forma d'uma meza, colocada debaixo de duas árvores, com tres assentos de pedra ao lado, e ali se faz Audiência de 15 em 15 dias, de sorte que quando chove e muito principalmente no inverno está a Justiça exposta ao rigor do tempo; e he esta a inde­cencia e estado em que se acha o local da Audiência; pretendia por isso o sup.te que V. Mag.e lhe fizesse a Graça de Provisão, para das sobras do Cabeção da Sisa do Conc.o de V. N. de Gaya a que he annexo o Couto d'Avintes, se mandasse edificar por essas sobras uma casa de Audiência no dito Couto, pelo que: P. a V. Magestade se digne mandar fazer a Graca que implora. E.R. M.e".
O pedido foi apreciado na sessão da Câmara do Porto de 6 de Março de 1830 que o indeferiu, alegando que o concelho de Gaya necessitaria muito mais duma obra como essa, devido a ser um aglomerado de freguesias. E assim continuou a justiça em Avintes, a sofrer as provações do tempo… 
O julgado de paz de Avintes incluía Oliveira do Douro e Vilar de Andorinho. 
O julgado de Avintes será extinto por decreto, em 29 de Junho de 1886 e a substituição do juiz ordinário pelo juiz de paz deu-se a 1 de Junho de 1889. 
Em relação ao couto de Avintes em 1758: 
"Tem juiz ordinário por vottos e eleiçam do Povo, que faz e confirma o Excelentíssimo Conde ou o seu Procurador como Domnatário a quem passa carta de ouvir deferindolhe Juramento, e entregando alvará a quem há-de servir o Anuo... cujo juiz conhece das Caujas civeiz com alçada dando apelaçam, e Aggrávo para a Relaçam do Porto a cuja Comârca pertence o crime, e couzas de mayor alçada". 
Gondim conta-nos que as "audiências faziam-se às quartas-feiras, pelo meio-dia. No banco mais alto costumava sentar-se o juiz do couto, em­punhando a sua vara vermelha, enquanto o escrivão escrevia so­bre a mesa, e o mei­rinho apregoava as arrematações". 
"Em 1829 reque­reu o Juiz do Couto d'Avintes ao governo a edificação de uma cadeia nesta fregue­sia e Couto", mas tal não veio a acontecer pois "... se esta casa de correcção podia prestar alguma utili­dade a uma fregue­zia... muita mais pres­taria a um Concelho, como o de Gaya, que he um aggregado de freguezias..." 
O último juiz do couto a dar audiências foi Francisco Rato de Quintã. 
A Pedra da Audiência constitui pois, o ex-libris de Avintes e é um monumento de grande importância histórico-arqueológica, símbolo de tempos áureos da nossa freguesia e reduto da vontade e justiça populares. 
Cumpre-nos, portanto, zelar pela sua conservação e promover a animação deste conjunto arquitectónico, pois viver a história é preciso! 
Não seremos os primeiros, nem esperançosamente os últimos. Em 1936 foram feitas algumas obras de conservação neste monu­mento dirigidas pelo arquitecto Manuel Marques. Mais tarde, em 1942, uma comissão integrando avintenses como o Dr. Alves Pereira e outros organizaram um magnífico cortejo etnográfico com a participação do Grupo Mérito Dramático Avintense, Rancho Folclórico das Padeiras de Avintes, Rancho das Ceifeiras, grupos de moleiros, pescadores e raparigas com as suas vistosas capas de missa. Culminou essa tão valorosa iniciativa com o descerramento de uma placa de mármore comemorativa do bicentenário da Pedra da Audiência.


Não só imagética, mas literalmente, a justiça tombou com as agruras do tempo. No dia 25 de Abril de 1961 o vetusto e velhinho sobreiro é derrubado por uma rajada de vento que arrancou impiedosamente as raízes seculares dum passado glorioso de independência e autonomia. Passado algum tempo, um outro foi plantado para dar continuidade à história, à sombra do qual outras sessões já decorreram. 
No ano de 1992, no dia 5 de Setembro, comemorou-se os 250 anos da Pedra da Audiência com o descerramento de uma placa evocativa de avintenses ligados à conservação do monumento, e a representação, por actores avintenses, do Auto Teatral "Reconstituicão dos Julgamentos na Pedra da Audiência-Avintes" versão livre de J. Costa Gomes. Esta iniciativa integrava-se no III Fórum Avintense levado a cabo pela Junta de Freguesia”. In site Avintes. net



1881


Estufa na actualidade – foto Público


Pormenor do portão da Quinta da Lavandeira 


A quinta foi comprada pela C. M. de Gaia que a transformou no belo Parque da Lavandeira.

Na margem esquerda, em Avintes, existiu a Quinta da Lavandeira que pertenceu ao Conde António da Silva Monteiro (1822 - 1885), e que lá viveu com a sua esposa, Sra. Condessa D. Carolina Júlia Ferreira Monteiro, que continuou a residir na Quinta até 1921, razão pela qual a propriedade também é conhecida por Quinta da Condessa. Aí nasceram as muito conhecidas Senhoras Silva Monteiro, Carolina, Ernestina e Maria José, 3 irmãs que se distinguiram no meio musical portuense como professoras de piano. Foram alunas de Óscar da Silva e professoras de vários ilustres músicos, como, por exemplo, Fernanda Wandschneider. 
Parque da Lavandeira 



SETIMA CARTA

Apesar de se não poder fazer sempre a viagem da Régua ao Pinhão num dia, eu a farei nesta carta para que a descrição se torne mais interessante.
Já disse que os rios Corgo e Barosa separam o Baixo do Cima Corgo – o rio Pinhão separa este do resto do distrito vinhateiro, que eu chamo o Alto Douro.
O Corgo, chamado Corrugo pelos romanos, nasce nas vizinhanças de Vila Pouca, passa por Vila Real, recebe as águas do Tanha ao pé da Vila da Persegueda e caí no Douro entre a Régua e Canelas.
Os rios tributários do Douro entre o Corgo e o Pinhão são o Tedo, o Távora, e o Torto.
O Távora, ou Soberbo, tem origem numa fonte de Trancoso e aumentado por diversos ribeiros e regatos, divide os dois bispados de Viseu e Lamego, passa pela Vila de Távora e o Lugar de Tabuaço e daí caminha para o Douro.
Este rio deu o seu nome à ilustre família dos Távoras, e mandou-se chamar Soberbo, depois que o último marquês daquele título padeceu ignominiosa morte no Cais da Belém a 13 de Janeiro de 1759, por alegarem ter ele parte na conjuração contra El-Rei D. José I; porém o rio é ainda vulgarmente conhecido pelo seu antigo nome.
Na marca actual do Douro, os rios Corgo, Tua, Barosa e Távora, apenas são pequenos regatos – e os rios Tedo e Torto estão secos de todo.
Há poucas propriedades nas margens do Douro, desde o Piar até à Barca d’Alva que eu não possa descrever com a mesma exactidão como se fosse seu próprio dono – porém se eu declarasse que uma grande parte do vinho oferecido à venda nas adegas mais bem situadas, indicando estas uma por uma, não é produzido dentro da demarcação da Feitoria, mas trazido de muitas léguas de distância em odres – se mencionasse os nomes daqueles que em outro tempo não se envergonhavam de declarar que não havia baga nem mixórdias no Douro, sendo eles os principais cultivadores de sabugueiros e praticantes de adulterações – se indicasse a extensão de outras propriedades mencionando o número de alqueires de centeio que levam de semeadura – se enfim eu marcasse os sítios dos mais finos vinhos brancos ou tintos, notando quem se mostra mais amigo das castas de bastardo e arvarilhão, e quem prefere as de Touriga e Souzão, dizendo só a verdade e desmascarando os maiores inimigos da prosperidade ao seu país, iria contudo ofender interesses particulares e embrulhar alguns inocentes com culpados, e por isso, por enquanto, limitar-me-ei a descrever o que como viajante vi e presenciei ou o que por muitas vezes tenho visto mas sem me ocupar com individualidades.
Ambas as margens do rio nesta extensão de 4 léguas são muito elevadas e estão cobertas de vinhas – havendo entre elas bastante azeite. Agora não se pode falar nesta propriedade, porque pertence ela a um dos actuais ministros, logo as más-línguas haviam de dizer que eu pretendia dele algum crachá.
Na Folgosa e no Pinhão costuma ás vezes haver bom carneiro, mas geralmente o carneiro deste país e muito magro e rijíssimo. O pão de Lamego e Portelo é o que se gasta na Régua e Folgosa: - no Pinhão acha-se a vender pão de Provesende a Favaios. É digno de se notar que até aqui todo o pão é de trigo e milhão, e só daqui para cima é que principia a haver pão de centeio.
Numa estalagem do Pinhão onde mandei recolher três cavalos meus, por uma noute, em razão da escassez de palha e grão, custou-me a sua ração dous mil e trezentos reis.
Já tenho dito que, ainda que no Piar principiem os xistos, não há pedras no rio, (exceptuando algumas de pequena dimensão no sítio da Sermenha, Corvaceira e Salgueiral) até ao Corgo: porém há-de ser difícil acreditar que exista nos países menos civilizados rio algum que se ache em tal estado do maior abandono, com tantas pedras à vista e tão fáceis de tirar como as que actualmente existem entre o Corgo e o Pinhão.
Quantas leis e decretos se têm feito ordenando impostos para melhorar a navegação do rio e tratar das obras da barra! Desta mesma barra em que os cartagineses de Himilcão naufragaram no ano do mundo 3531. Tenho todos esses decretos na minha colecção de papéis curiosos, mas por mais diligências que tenha feito não vinte e tantos anos que conheço o rio Douro, ainda ninguém me tem podido informar do destino que se tem dado aos impostos do rio e aos da barra. É verdade que 200 reis em pipa "para as pedras" não havia de render mais do que uns vinte contos anuais; porém em 10 anos importaria em duzentos contos e com tal soma muitas e importantíssimas obras se poderiam ter feito; muito preciosas vidas se teriam salvado e grandes valores de fazendas se não haveriam perdido.
Sobre estradas achamos de bastante interesse o Alvará de 13 de Dezembro de 1788, em que a Soberana declara que "sendo plenamente informada de que havendo-se dificultado pelas ruinas em que se acham as estradas que decorrem por uma e outra parte do Alto Douro o beneficio de todos que comerceiam em vinhos daquele distrito e sendo deste inconveniente também uma das causas principais, a de não haver na longitude daquele distrito uma estrada que sirva de auxilio à navegação dos barcos que sobem e descem pelo Rio Douro, nos tempos em que a nímia abundância ou a grande falta de águas dele dificultam, a sua pronta navegação, sou servida ordenar que se construam as referidas estradas, na forma mais pronta e perfeita, de que os respectivos terrenos forem capazes etc, etc."
Tem decorrido 66 anos e as estradas ainda ficam em projecto!!!
Os arrais chamam pontos ou galeiras, aos obstáculos à navegação e em uma das minhas obras já publicadas menciono que existem tem todo o rio 210 destes pontos, todos os quais estão actualmente à vista. Os pontos do Corgo, Baguste, Outeiro de Covelinhas, S. Martinho, Moreirinha, Seco do Ferrão, ponto novo do Ferrão, Canal de Moura, Cachucha, Chanceleiros, Oliveirinha, e Sopas ou Buxeiro, são objectos que envergonham o actual governo de Portugal, por serem estes de fácil melhoramento. Quanto ao ponto do Canal das Marcas, o seu concerto seria mais custoso.
Julgo, Srs. Redactores, que os seus dignos compatriotas não levarão a mal as impressões de que me tenho servido, filhas do vivo interesse que tomo na prosperidade deste país, escrevendo na minha barquinha estas cartas e subindo estes mesmos pontos à força de trabalho dos infelizes marinheiros, trabalho que bem podia evitar-se.
Sou de VV.
J.J. Forrester 
Publicada por Porta Nobre à(s) 6/10/2013

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