sábado, 7 de dezembro de 2013

DIVERTIMENTOS DOS PORTUENSES - XXVIII

3.5.10 - Casas de espectáculos - III


Teatro e café Águia D’Ouro – Inaugurado em 1839 como café e a partir de 1908, cinema - á direita está o Cinema High Life antes das obras do Cinema Batalha em 1947. 
Em 1903 esteve lá um circo de cavalinhos.

“Nessa época (primeiro quartel séc. XIX) iam as famílias do Porto ao teatro de mantilha pela cabeça, e nos dias de chuva não faziam reparo em as sacudir para a plateia, estendendo-as depois pelo camarote abaixo. Um alguidar de arroz, com um galo espetado no meio, acompanhava sempre o rancho, que se estabelecia comodamente à roda do petisco, conservando os ouvidos apurados para os chistes das comédias, e os olhos prontos para manifestar as impressões causadas pelas infelicidades do drama.
Cada um descansava o seu corpo numas cadeirinhas de pinho, alugadas por 10 reis, à entrada, mas consta-me que se estava perfeitamente no teatro. Oh! Nos bons tempos tudo era mais forte!
A ceia ia, porque se representavam 10 actos de cada vez. Quando a peça não os tinha, faziam-se dando espectáculo de tarde e à noite e muita gente ficava nos seus lugares para assistir a ambos, e até penso que havia algumas famílias que ficavam para o dia seguinte, indo já prevenidas com travesseiros. Este uso do actor não falar para a plateia, nem os espectadores para a cena, ainda não existia. O espectador quando se distraía, pedia ao artista que lhe repetisse o dito, e o homem, se não estava para isso, dizia-o com toda a franqueza, lembrando ao curioso que o fosse ouvir pra outra vez. 
Nos bons tempos, não era a moda que levava ao teatro: era o puro amor da arte! O sentimento da compaixão, que faz com que actualmente o público, às vezes esteja ouvindo com todo o sossego o artista enfermo, era proibido. Quando, diante dos nossos avós, alguém aparecia constipado em cena, um osso arremassado da quarta ordem, mandava logo esse alguém para a cama, isto é, lembrava-lhe o lugar dos enfermos”. In O Tripeiro, Volume I, por Agostinho Albano em 1871. 

Para compreender melhor toda esta preparação do público basta saber que no Teatro S. João, na noite de 12/1/1854, foram cantadas as óperas Ildegonda de Melesio Morales, Lucia de Lammermoor de Donizetti, Rigoletto de Verdi e D. Sebastião Rei de Portugal também de Donizetti. Noutras noites o mesmo aconteceu, com outras óperas.


Café e Teatro Águia d’Ouro – 1906 – foto Aurélio Paz dos Reis – esperando alguém importante?
Camilo Castelo Branco no tempo em que morava no Porto, na Rua de S. Lázaro, ia quase todas as tardes para o antigo e afamado botequim da Águia d’Ouro jogar o dominó, quando não ia para o café das Hortas.


Fachada de 1914 – Reabre em 1/1/1914 sendo arrendatários Arnaldo Rocha Brito, Pimenta da Fonseca e António Castro.


Interior em 1929


Fachada das obras de 1931



Bilhete de 1941 – 3$00

“O Café Águia d’Ouro abriu as suas portas no primeiro mês de 1839, por lá passaram algumas figuras ilustres portuguesas como Camilo Castelo Branco e Antero de Quental. Em 1908 esta velha casa abre-se também ao cinema. A novidade era o “cronomegaphone” considerado “o mais moderno aperfeiçoamento do cinematógrafo falante”, não sendo cinema sonoro, já que este só apareceu 20 anos mais tarde. Ainda em Agosto de 1907, chegara a estrear o “Cinematógrapho Edison” sendo o espectáculo dividido em três partes e visto com um só bilhete, os preços para a altura eram bastante económicos; cadeiras 100 reis e galerias a 50 reis. Em 15 de Setembro de 1930 viria a inaugurar-se o cinema sonoro com o filme “All that Jazz” com Al Jolson. A 7 de Fevereiro de 1931 foi reaberto após obras de remodelação, tendo ficado com uma nova fachada, a actual e sustentando no seu pórtico o símbolo, uma águia de ouro. Em 1989, já com o café fechado e a ausência de espectadores às salas de cinema o Águia viu-se forçado a encerrar as portas, tendo sido comprado pela empresa Solverde com o objectivo de abrir um Bingo, tendo sido reprovado tal projecto por parte da Câmara. O espaço ficou ao abandono e com o passar do tempo tornou-se uma ruína em elevado estado de degradação. Em Agosto de 2006 a Solverde põem o imóvel à venda por três milhões de euros” In Cinemas do Porto.
Al Jolson - Swanee 

The Jazz Singer – Al Jolson 

Parece-nos haver uma confusão ente os filmes All that Jazz e The Jazz Singer, dado que o primeiro é de 1979 e este de 1927, cantado por Al Jonson.


Hoje é o hotel B&B Porto Centro – foto blog Cidade Surpreendente 


Teatro Chalet na Feira dos Carneiros, no local onde hoje está a estação do Metro da Trindade – Com o drama “A escravatura na América” realizou-se o último espectáculo em 2/4/1899, sendo em seguida demolido para ampliação do Horto Municipal. 

Em 27/11/1886 é inaugurado o Theatro Camões na actual Rua de Alferes Malheiro onde foram levados à cena diversas companhias de amadores. Também aqui foi apresentada uma opereta de autoria de Carlos Dubini, por si dirigida.


Aurélio Paz dos Reis (1862/1931)


Flora Portuense – casa de venda de sementes e plantas no lado Poente da Praça da Liberdade.

“Proprietário de um próspero negócio de floricultura, a conhecida loja "A Flora Portuense", Paz dos Reis (1862/1931) era também um excelente fotógrafo. Planeando dar início a uma actividade produtora, parte então para Paris, com vista à aquisição de um aparelho dos irmãos Lumière. Perante a recusa dos mesmos, Paz dos Reis adquire um outro aparelho de filmar, positivar e projectar.





O kinetógrapho era o aparelho com que o artista trabalhava, comprado em Paris.


Forma uma sociedade com seu cunhado, fotógrafo profissional, Francisco Fernandes Magalhães Bastos Júnior e António da Silva Cunha, industrial proprietário da Camisaria Confiança e figura de grande relevo social na altura. Filma então, "Saída do Pessoal Operário da Fábrica Confiança", "Feira de Gado na Corujeira", "Chegada de um Comboio Americano a Cadouços", "O Zé Pereira na Romaria de Santo Tirso", "Azenhas no Rio Ave", "O Jogo do Pau", "Rio Douro", "No Jardim", "O Mercado do Porto", "O Vira" e "A Dança Serpentina".

Embora Portugal já tivesse assistido ao rodar da manivela por Harry Short, o cinema português nasce então, em berço portuense, pela mão de Aurélio Paz dos Reis.

Saída do pessoal da Camisaria Confiança – Aurélio Paz dos Reis – 11/7/1896
http://www.youtube.com/watch?v=8sOXcHj-exY


Teatro Príncipe Real – Sá da Bandeira desde 1910. à direita ainda se vêem os Armazéns Hermínios.


"Em 12 de Dezembro de 1896, Aurélio da Paz dos Reis apresenta no Teatro do Príncipe Real o fruto do seu "Kinetographo Portuguez", a primeira sessão portuguesa de cinema com filmes portugueses filmados por um português. O público acede e aplaude e o Kinetographo dirige-se para Braga para novas sessões, regressando de novo para o Porto e depois para o Rio de Janeiro.
Em terras brasileiras e devido sobretudo a falhas técnicas, Aurélio da Paz dos Reis, não consegue fazer singrar o seu trabalho. Desiludido regressa a Portugal a 24 de Janeiro de 1897 e abandona a cinematografia”. In site amordeperdicao.pt




“A quatro de Agosto de 1855, é inaugurado como Teatro Circo, um barracão de madeira, mandado construir por D. José Toudon Ferrer Catalon para a sua companhia equestre. Em 1867 foi demolido para se fazer outro de pedra e cal, por sua vez substituído, dez anos depois, pelo edifício que chegou até aos nossos dias. Até à abertura da rua Sá da Bandeira, em finais da década 1870, quando foi construída a sua fachada para aquela rua, o teatro tinha acesso apenas pela então rua de Santo António, por umas escadas que ainda existem. Por essa altura passou a chamar-se Teatro-Circo do Príncipe Real. Ali se apresentou em Novembro de 1895, Sarah Bernhardt, com várias peças entre as quais "A Dama das Camélias" e "Fedora"; foi ali a primeira apresentação, no Porto, do Animatógrafo («do electricista Sr. Rousby» em 17 Julho de 1896) e também ali, a 12 de Novembro de 1896, que Aurélio Paz dos Reis apresentou os primeiros filmes realizados por um português. Em Outubro de 1910 (uma semana depois da implantação da República) troca o nome de Teatro do Príncipe Real pelo de Teatro Sá da Bandeira. Um dos seus mais notáveis empresários foi Afonso Taveiro, que viria a morrer de apoplexia, em plena plateia do teatro, quando dirigia o ensaio geral da revista "O dia de Juízo" de Eduardo Schwalbach. Porém, em 1910 surge o seu maior mentor: Arnaldo Moreira da Rocha Brito que foi empresário deste teatro até á sua morte em 1970 completando 60 anos de gerência. Foi um dos primeiros, se não o primeiro teatro do porto a usar iluminação eléctrica em vez da iluminação a gás. Em Maio de 1899, quando ali se apresentou a Companhia de Teatro Nacional D. Maria II de Lisboa, os cartazes anunciantes continham a indicação de que "Em todos os espectáculos desta companhia, a sala e o palco são iluminados por luz eléctrica, o que proporciona aos espectadores uma temperatura agradável". In Wikipédia

Caminhos da História - Joel Cleto
http://videos.sapo.pt/9e8cYEMmHcEeqh1cctnl








Costinha, António Silva, Ribeirinho e Beatriz Costa

Um texto de Porto Tripeiro “No Teatro Sá da Bandeira, durante o ano exibiam-se companhias de revistas de Lisboa. Revistas que por norma criticavam o Governo de António Salazar, chacoteava as figuras públicas do Porto. O preço dos bilhetes era acessível a todas as classes desde a plateia, ao balcão e os camarotes. Estes, a maior das vezes eram utilizados por grupos, por vezes até desconhecidos, para que a entrada ficasse mais em conta. 
Ora a revista no Porto era um importante acontecimento. Vasco Santana, Costinha, António Silva, Beatriz Costa e ainda outros que não me ocorrem á memória actuaram nessa casa que foi uma sala de espectáculos cultural de crítica, inteligentemente, interpretada e sofisticada pelos actores que por gestos e palavras o tripeiro entendia a quem os reparos eram dirigidos. Evidentemente ao regime ditatorial; aos buracos e barracas que o Porto tinha. O tripeiro assistia, hilariantemente, com bom agrado a essas exibições. Ao outro dia as interpretações dos actores eram chacoteadas entre os amigos na mesa do café e em família. A crítica ajudava a desopilar fígado aos tripeiros. Pelos cafés e restaurantes, finos, da baixa movimentavam-se os “pides”, na sombra do quartel general da Rua do Heroísmo (a portas com o Cemitério do Prado Repouso), havia assim o cuidado dos tripeiros sussurrarem as cenas teatrais do Sá da Bandeira com esmero cuidado não fosse, porém, andar por ali um “bufo” (conhecidos, assim, por “ ovelhas ranhosas” os informadores da polícia política de Salazar) e, por uns dias ficasse a “pão e laranjas” na Heroísmo e heroicamente aguentar umas chicotadas de cavalo marinho no costelado; registado o seu nome no livro do deve e haver, da PIDE como simpatizante da política, comunista, de Lenine da “Cortina de Ferro”. Famosa na altura foi a revista os “Parolos de Santa Comba” , cuja esta, como era óbvio, era dirigida a Salazar.”
Surgiam no palco actores vestidos, de parolos, de colete e calça de surrobeco e barrete, comprido, de pêra na ponta e cantava: “...nós vimos de Santa de Comba ó rebim-bimbim ó rebim-bimbão nós a todos tiramos e todos no-lo dão...” A figura principal era o grande actor, humorístico, Costinha. Homem atarracado e desde que entrasse em cena o público ria-se a bandeiras despregadas. As instalações da Estação da Trindade era um barracão velho na altura. Assim se conservou por mais uns anos bons. Nos “Parolos de Santa Comba” havia uma cena da peça onde era encenado o degradado barracão. O Presidente da Câmara, na ocasião, era um tal Luis de Pina. A figura do Pina está na cena bem representada e o seu interlocutor era nem mais nem menos que o actor Costinha. Este faz-lhe imensas perguntas a que o Pina lá lhe ia respondendo conforme podia e sabia e o Costinha: “Sr. Pina aqui não opina nada, nada...” Neste instante uma bomba estoirava no barracão, de papel, desfazendo-o e provocando enormes gargalhadas entre os espectadores.

Cena de O Pátio das Cantigas (1942) – com Vasco Santana e Ribeirinho

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