segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

DIVERTIMENTOS DOS PORTUENSES - XXXIV

3.5.13 - Carnaval


“Carnaval é uma festa que se originou na Grécia em meados dos anos 600 a 520 a.C. Através dessa festa os gregos realizavam seus cultos em agradecimento aos deuses pela fertilidade do solo e pela produção agrícola.
Anos mais tarde e com o avanço do cristianismo, a Igreja Católica começou a combater todas as festas e manifestações pagãs, e com a impossibilidade de exterminar a sua prática, acabou por incorporá-las às suas crenças como o Natal e o Dia de Todos os Santos. No entanto, entre todas as festividades, o Carnaval foi uma das poucas a manter suas origens profanas.


O Carnaval passou a ser uma comemoração adoptada pela Igreja Católica em 590 d.C. A etimologia da palavra Carnaval ainda é controversa. O historiador Dr.Hiram Araújo no seu Livro "Carnaval – seis mil anos de história”, afirma que em 590, o Papa Gregório I, O Grande regulamentou as datas do Carnaval, e criou a expressão - “dominica ad carne levandas” - que significava (domingo não se come carne) que foi sucessivamente sendo abreviada até a palavra Carnaval. 
Outros pesquisadores citam a origem vinda do latim medieval “carnevale” (adeus a carne). 
Comemorava-se então o Carnaval, período que antecedida a Quaresma, ou seja, os 40 dias entre a quarta-feira de Cinzas e o domingo de Páscoa. A Quaresma deveria ser o período de penitência e jejum para preparar o corpo e a alma para a Páscoa. Por isso, nos dias que antecediam a Quaresma, a população se dedicava aos prazeres da carne “carnis vales”, sendo que “carnis” significa carne e “vales” prazeres. O Carnaval comemorado na Antiga Roma era marcado por celebrações em busca dos prazeres e brincadeiras. Todos os negócios eram suspensos, os escravos eram libertados no período, as pessoas trocavam presentes, elegia-se um Rei de mentira que saia em cortejo pelas ruas da cidade e as restrições morais eram relaxadas.
Já na época do Renascimento (entre o século XIII e século XVII), incorporaram-se fantasias e bailes de máscaras e bailes ao Carnaval. O Entrudo (período de três dia que precedem a quaresma) era uma festa popular em que as pessoas divertiam-se lançando farinha, baldes d’água, limões de cheiro, entre outras coisas, nos outros".  Blog ePORTUGUESe da OMS.


“Os diversos géneros de galhofas em que pelo Entrudo, se vai sucessivamente alambazando a alegria deste povo constitui uma fase importante da história dele. 
Antigamente as grandes comezainas eram a parte principal desta festa, o alguidar de arroz do forno, a taça em que se retoussavam e trebelhavam os honestos júbilos da família, e a orelheira com feijão branco eram a base sólida sobre que descansava o edifício do contentamento doméstico… A alegria dos nossos avós zoupeira e trambolhuda, depois de enxouriçada com feijão e marufo não saía ordinariamente de casa senão para ir jogar o panelo para o quintal. Era aí que o gentio desse tempo, de máscara atada nas orelhas ou de carão encarvoado, entrava a pinchar e a bufar para o outro em sinal de que iam começar as arrelias e os coices de que constava a brincadeira: os pós pela cabeça abaixo, o rabo-leva na saia ou na casaca, o breu nas cadeiras, o pó das comichões pelo espinhaço, a estopa metida nas filhoses e os ovos de cheiro espapaçados na cara. Salta dacolá um vestido de preto com uma bexiga amarrada a um pau, fazendo estoirar a bexiga, e de quando em quando o pau nos lombos e nos testos da assembleia. Foge este com a cadeira pegada nas calças, aquele aos saltos porque tem as pernas presas com um barbante, um com um regador atado a um pé, dois escambulhados porque os coseram um ao outro, e uma senhora idosa dando muitos gritos porque lhe prenderam a um artelho um canzarrão que, desabituado de andar à trela, lhe aperta a fuga mordendo-lhe nos calcanhares e na barriga das pernas. Dentro de alguns minutos debanda tudo, ficando apenas no quintal um homem vestido de boi, o qual não vendo pelas fendas da máscara continua a mugir como pede o carácter que representa, escarva com os pés nas sementeiras e dando marradas na figueira, que ele, pelo feitio, imagina ser a sogra…
A geração seguinte mudou totalmente o Carnaval. Ainda vivem na memória as famosas cavalhadas desse tempo, as carruagens apinhadas de máscaras distribuindo ramalhetes e pastilhas, em todas as janelas tantas senhoras quantas lá cabiam, as principais ruas atulhdas de uma compacta multidão de gente, maior parte dela mascarada, centenares de “soirées” onde se dançava até ao dia seguinte, e longas caudas de concorrentes esperando o momentode entrar ás portas de todas as casas onde havia bailes”. Ramalho Ortigão in O Tripeiro, Volume V, 15 de Fevereiro de 1926.


        Em 7 de Fevereiro de 1869 realizaram-se animadíssimos bailes de máscaras nos teatros de S. João e Baquet, no circo da Rua de Santo António, na nave central do Palácio de Cristal e no Palácio do Corpo da Guarda, no salão Euterpe (hoje Ateneu Comercial do Porto) e noutros recintos públicos. Mas a maioria dos bailes realizavam-se nas casas particulares das famílias abastadas. 


No Carnaval de 1872 o grande e infeliz poeta Guilherme Braga foi a Vila da Feira tomar parte de um baile de máscaras efectuado na casa do Dr. Bandeira. Decidiu não levar máscara, mas vestindo um fato vermelho, alugado no Porto, na Casa das Figuras de Cera. 
Improvisou nas folhas que trazia na carteira 92 quadras, que distribuía pelas pessoas a que se referia.
A António Maciel de Lima entregou-lhe:

Conheço um António Lima
Que a minha filosofia
Não sabe se é lima ou pêra
Ou maçã ou melancia…

O que todos me afiançam,
Verdade que o atormenta,
È que este fulano Lima 
É Lima…de ferramenta.

Depois de ter versado os homens presentes, ás senhoras dedicou irónicas, mas elegantes quadras, tais como:

Quem tem rido à custa alheia
È bom que pague também…
Chegou a vez das senhoras;
Agora escutem-me bem:

Das casadas nada digo; 
Dessas os cinco sentidos
Apenas lhes impõe deveres 
D’agradar aos seus maridos

Quanto às solteiras, que vezes
Um rouxinol solitário 
Não tem dito por Fijó:
“Ai Maria do Rosário!

Apesar de ser corrente
Que, por capricho, talvez,
Namoraras sem escrúpulo
Trinta janotas num mês.

À Francisquinha Estefânia
Que vezes não tem ouvido
De mil corações a um tempo
O soluçante gemido.

Até consta que no Porto
Ao passar um regimento
Pela rua onde reside
Este da Feira portento,

Ficaram todos no corpo
Da Chiquinha apaixonados.
Capitães, alferes e músicos, 
Até os próprios soldados!

(esta Francisca Estefânia era irmã do poeta)
Nos seus versos referiu-se a todas as meninas da festa e por fim ao anfitrião.


Carnaval de 1902 – capa de O Tripeiro da 7ª. Série –Ano XXI

Em 1880 havia um divertido grupo que se reunia na Tabacaria Freitas & Azevedo, na esquina da Rua dos Clérigos com a Rua do Almada, e que incluía rapazes e velhos, de todas as idades e posições sociais que decidiu celebrar o Carnaval com uma brilhante cavalhada carnavalesca. Composto desde o mais modesto caixeiro de escritório ao mais considerado comerciante, desde o mais ingénuo filho de família ao mais distinto titular, clero, nobreza e povo estavam ali bem representados. Organizaram esta diversão na casa do Visconde de Vilarinho e S. Romão.
A cavalhada representaria a entrada do Príncipe de Gerolstein no Porto.
Este cortejo impôs-se pela sua imponência e pelo seu luxo. Todo o seu guarda-roupa era autêntico. Fardas e uniformes foram cedidos pelos próprios titulares.
Compunham-no uma guarda avançada de lanceiros de 8 cavaleiros, seguiam-se em carros abertos o presidente da Câmara, vereadores, governador civil, comissário da polícia, marinha, juízes, cônsules, titulares etc. Finalmente o carro do príncipe, seu escudeiro e fechava o cortejo um esquadrão de 20 cavaleiros.
Saíram da estação de comboio da Boavista, subiram a rua deste nome, seguiram Cedofeita, Carmo, Clérigos, Santo António até à Batalha.
Neste percurso juntou-se uma multidão que os aplaudia delirantemente.
Foram participantes o próprio Visconde de Vilarinho e S. Romão, seu irmão Júlio Girão, Guilherme Gomes Fernandes e outras personalidades da cidade, acompanhadas pelos mais humildes profissionais, todos pertencentes ao referido grupo.
Baseado num artigo de O Tripeiro, Volume 2 de 1/1/1910.



Bandeira dos Fenianos



Foi no ano de 1905 que o Clube de Fenianos ressuscitou o Carnaval, há muito tempo sem festejos. Foi fundado em 1904 por cidadãos republicanos e políticos contra a situação. 

“Comemorou-se a 25 de Março deste ano o aniversário deste clube fundado por um grupo de bons Cidadãos Nortenhos – o CLUBE FENIANOS PORTUENSES. Inscreve na sua bandeira a legenda “PELO PORTO” – símbolo da divisa que no futuro orientaria as suas realizações, a favor do progresso e civilização da CIDADE INVICTA . Os primeiros estatutos do clube são aprovados por alvará do Governo Civil do Porto a 17 de Junho de 1904.
Colectividade de grande prestígio realizou ao longo de anos e anos, eventos na cidade do Porto,
como Cortejos de Carnaval, Bodas aos pobres, festejos de S.to António, festas de Verão, além de ter contribuído com a sua influência social para a resolução de carências da cidade e da sua população, como a abolição das Portagens da Ponte D. Luís I, a regalia do descanso dominical, a inauguração rápida dos serviços de viação eléctrica para V. N. de Gaia, a criação de sociedades de Previdência Social, a criação do Teatro lírico ou Teatro modelo (hoje Teatro Nacional de S. João), o socorro a vitimas de catástrofes e o auxilio a combatentes, o alargamento do Estatuto do Porto de Leixões, de porto de abrigo a porto comercial.
Na construção da actual Sede Social foi lançada a 1º Cunhal em Agosto de 1920 com a presença do Dr. António José de Almeida, então Presidente da República, e que já em 1910 tinha inscrito no LIVRO DE HONRA do clube a seguinte frase: “ ESTE CLUBE É O EXEMPLO DE QUE A UNIÃO FAZ A FORÇA ”.
A partir daqui foram muitas as acções e actividades desenvolvidas, desde ginástica, iniciação musical, bilhar, filatelia, xadrez, ténis de mesa, conferências e debates sobre vários temas.
São inúmeras as homenagens, os galardões, as medalhas de mérito e os louvores recebidos de diversas entidades da vida portuense e nacional". In Associação das Colectividades do Concelho do Porto – 1929

Site do Clube de Fenianos Portuenses 


Carnaval de 1905 na Rua das Carmelitas - já existe o prédio onde estão os Armazéns da Capela, mas o mais baixo foi destruído para a construção do quarteirão entre as Ruas Cândido dos Reis, do Conde de Vizela e da Fábrica.


Casa Mattos & Serpa Pinto – Rua Sá da Bandeira – Carnaval de 1905


Carnaval 1905 – Rua de santo António – Janela ornamentada da Ourivesaria Reis, anterior à mudança para a esquina com a Rua de Santa Catarina.


Rua de Santa Catarina – 1905 – foto Alvão

Carnaval de 1905 - Vídeo


Carnaval 1905 – Avenida das Tílias, Palácio de Cristal - Photo Guedes



Carnaval 1905 – Banda de música de Guimarães – Palácio de Cristal


Preparação do Carnaval 1906 – foto Aurélio Paz dos Reis


Carnaval de 1906 na Rua de Santa Catarina – Desfile do Clube dos Fenianos – Esquina da Rua Passos Manuel – no local do edifício baixo serão mais tarde os Armazéns Nascimento e depois o majestoso Café Palladium.


Carnaval de 1906 – sócios dos Fenianos em frente ao cinema Águia d’Ouro.


Carnaval dos Fenianos – em frente à Igreja do Carmo - 1908


Carnaval dos Fenianos -1909



Carnaval Portista - 1925


Festa de Carnaval dos Fenianos - 1931





4 fotos do Carnaval dos Fenianos de 1939


Cortejo Fenianos - 1954 

Carnaval 1954 – Cortejo do Clube de Fenianos -vídeo 


Vae na Praça de D. Pedro 
D’óra ávante, às quintas-feiras 
Haver bellas pagodeiras 
De rico pópó gim gim; 
Foi o Arnaldo Soares 
E mais o Arthur Barbedo, 
Que andaram muito em segredo 
E até o correlegionário 
P’ra levar a coisa ao fim. 

N’esses dias hão-de ver 
Que grande brodio alli vae 
Inteiro o Porto alli cae 
A dar à perna, a dançar; 
Dança o D. Pedro de Bronze, 
Dança o Porto camarário 
Também à perna há-de dar. 


No Carnaval de 1913 um grupo de foliões, tendo-se-lhe acabado os habituais arremessos da época, resolve atirar pasteis de nata às beldades que, na Praça da Liberdade, se encontravam às janelas. Em tal quantidade que a polícias teve de intervir e os fizeram passar uma noite na enxovia. Na manhã seguinte foram libertados mediante o pagamento de 10.000 reis para os pobres.

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