domingo, 1 de setembro de 2013

DIVERTIMENTOS DOS PORTUENSES - II

3.5.4 – Serões e festas de família e de clubes


Horácio Marçal em O Tripeiro, Número Especial de 1974, e referente ao séc. XIX, informa-nos que: “De Inverno, como não havia festas, faziam-se visitas a pessoas amigas ou aparentadas, por via de regra, á noite. Aí pelas 10 horas, servia-se o chá, que os visitados, com simulada modéstia, designavam por pinga de água morna. Juntamente, apareciam as fatias de pão com manteiga, os biscoitos de argolinha, ladrilhos de marmelada e queijadas do mosteiro de S. Bento de Avé Maria, iguarias estas dispostas na bandeja com determinado requinte. Se algum dos convidados não apreciava chá (o que raras vezes acontecia), serviam-lhe então uma pinga do choco, isto é, um cálice de vinho fino. No final do delicado repasto, vulgarmente, jogáva-se o loto ou quino a feijões. O jogo do quino era divertidíssimo, não tanto pela natureza, como pelas facécias que os circunstantes lhe interpunham ao cantarolarem os números. Se não havia jogatina, havia musicata ao piano pelas meninas ou pela dona da casa, pois nesses tempos já passados, era chique e de boa distinção saber dedilhar o teclado de um piano”. 
Estes romanticos serões terminavam ordinariamente pela seguinte frase atirada da porta da sala à multidão amarruada “está lá em baixo o criado das senhoras com o saco de chales e o lampião”. 

Alexandre Heculano viveu no Porto cerca de um ano, tendo acompanhado D. Pedro IV na sua entrada na cidade em 1832, com 22 anos. Foi-lhe dada a incumbência organizar a Biblioteca Municipal. Em carta, escrita em 1862 a uma senhora do Porto, afirma: "O Porto passou sempre por produzir bem só quatro cousas: dinheiro, morangos, nevoeiros e patriotas: eu protestei constantemente que produzia além disso uma quinta – lindas meninas. É verdade que começei os meus protestos quando vivia no Porto e tinha 25 anos; mas ainda hoje guardo pura a religião com que os fiz”.



“O uso do chá generalizou-se no Porto por acasião de duas grandes epidemias do reinado de D. PedroV. Até então era remédio para compor o estomago ou, quando muito, bebida de grande cerimónia. Mas depois que foi adoptado como ceia inofensiva servia-se às 9 horas da noite, o mais tardar, nas melhores casas da cidade” Alberto Pimentel




Sede da Assembleia Portuense a partir de 1859 – foi demolida aquando da construção da Avenida dos Aliados e ficava no local onde hoje se encontra o Clube dos Fenianos

A Assembleia Portuense foi fundada em 31/5/1834 na antiga Praça da Erva, depois Largo do Laranjal e finalmente Praça da Trindade. Pretendeu-se criar um local onde os associados pudessem encontrar-se para conversarem, jogarem “jogos lícitos” e lerem. Também aí se realizavam bailes de grande agrado dos sócios em que eram servidas bebidas e doces. Interessantes eram algumas das regras que proibiam os associados de entrar em certos locais com capote, chapéu e galochas que deveriam deixar na portaria. Só na sala de bilhar e de leitura era permitido usa-los. Era proibido cuspir, assobiar, discutir alto para não perturbar a ordem. Na sala de leitura o silêncio deveria ser absoluto. 
Este clube destinava-se à mais alta burguesia. 
Jocosamente chamavam à sala de convívio o “Palheiro”, pois tinha o chão forrado com uma “alcatifa” em esparto para maior comodidade dos sócios. Irónicamente, Camilo afirmou desconhecer a razão, mas como esta palavra vem de palha, talvez fosse para designar o alimento dos que a frequentavam. Todas as noites era distribuído gratuitamente pelos presentes chá e bolos. Em 1842 tinha mais de 300 associados. 
Em consequência do empobrecimento desta classe, por força das lutas políticas dos anos 40 do séc. XIX, houve muitos sócios que abandonaram a A.P. pelo que esta sofreu graves prejuízos. Pretendeu a Direcção acabar com o referido chá gratuito, o que causou grande divisão entre os associados. Realizaram-se diversas A.G. e ao fim de mais de um mês de discussões, os que pretendiam continuar com este costume perderam a votação em A. G. (c.f. Alberto Pimentel), pelo decidiram fundar uma nova associação.



Sede do Clube Portuense a partir de 1857, onde estava a Assembleia Portuense desde 1834 até à cisão dos sócios. Esta casa pertencia à família Ferreirinha.

Assim, em 24/5/1857 foi fundado, pelos associados dissidentes da A.P., o Clube Portuense. Eram várias dezenas de personalidades da Cidade do Porto, entre os quais se encontravam proprietários, futuros titulares, homens de governança da Cidade e diversos estrangeiros, nomeadamente ingleses cuja colónia detinha uma grande influência na sociedade e economia da Cidade. A Assembleia de Constituição foi na Casa da Fábrica, mais tarde infelizmente destruída. Era uma das mais belas casas do Porto e foi prometido reconstruí-la na Cordoaria, mas nunca tal veio a acontecer. 
Em 1924 mudou-se para a Rua de Cândido dos Reis, para o edifício aí construído pelo Conde de Vizela, onde ainda hoje se encontra.
Na década de 1980, o edifício foi adquirido pelos sócios ao antigo banqueiro António Brandão Miranda.


Este clube teve desde o séc. XIX uma intensa vida social, onde se realizaram dos melhores bailes da cidade, além de muitas outras actividades. Recebeu a visita de D. Pedro V em 1860 e da família Real, D. Luis, a rainha e seus filhos, em 1863; D. Carlos, em 1884, D. Manuel II, em 1908, e do Presidente da República, Dr. Cavaco Silva.





Carnaval de 1905


Carnaval de 1906


1931

“Comemorou-se a 25 de Março deste ano o aniversário deste clube fundado por um grupo de bons Cidadãos Nortenhos – o CLUBE FENIANOS PORTUENSES. Inscreve na sua bandeira a legenda “PELO PORTO” – símbolo da divisa que no futuro orientaria as suas realizações, a favor do progresso e civilização da CIDADE INVICTA .Os primeiros estatutos do clube são aprovados por alvará do Governo Civil do Porto a 17 de Junho de 1904. 
Colectividade de grande prestígio realizou ao longo de anos e anos, eventos na cidade do Porto, como Cortejos de Carnaval, Bodas aos pobres, festejos de St. António, festas de Verão, além de ter contribuído com a sua influência social para a resolução de carências da cidade e da sua população, como a abolição das Portagens da Ponte D. Luís I, a regalia do descanso dominical, a inauguração rápida dos serviços de viação eléctrica para V.N. de Gaia, a criação de sociedades de Previdência Social, a criação do Teatro lírico ou Teatro modelo (hoje Teatro Nacional de S. João), o socorro a vitimas de catástrofes e o auxilio a combatentes, o alargamento do Estatuto do Porto de Leixões, de porto de abrigo a porto comercial.
Na construção da actual Sede Social foi lançada a 1º Cunhal em Agosto de 1920 com a presença do Dr. António José de Almeida, então Presidente da República, e que já em 1910 tinha inscrito no LIVRO DE HONRA do clube a seguinte frase: “ ESTE CLUBE É O EXEMPLO DE QUE A UNIÃO FAZ A FORÇA ”.
A partir daqui foram muitas as acções e actividades desenvolvidas, desde ginástica, iniciação musical, bilhar, filatelia, xadrez, ténis de mesa, conferências e debates sobre vários temas.
São inúmeras as homenagens, os galardões, as medalhas de mérito e os louvores recebidos de diversas entidades da vida portuense e nacional". In Associação das Colectividades do Concelho do Porto

Carnaval de 1905 - Vídeo





Nas festas da alta sociedade do séc. XIX e até anos 20 do passado século, as meninas levavam um carnet de bal no qual iam anotando o nome dos cavalheiros que as convidavam para dançar e que elas aceitavam. Alguns eram muito luxuosos e mostravam a riqueza da família a que pertenciam. Por vezes causava dissabores ou revolta entre os candidatos, ou porque pretendiam antecipar a sua vez ou mesmo porque lhes era negada a dança pelos pais ou pela pretendida. Não era raro uma menina aceitar sucessivamente a inscrição do mesmo cavalheiro, o que era logo notado e comentado pela assistência. Estamos persuadidos que em casos extremos terá levado a algum um duelo. 


Mas havia outro tipo de carnet. Em certos bailes era distribuído um, à entrada, com a sequência das obras que iam ser executadas e seguida de uma linha onde era anotado o respectivo convidado.



Nos princípios do século XX existiu o Casino da Ponte, situado à esquerda da saída em Gaia do tabuleiro superior da ponte Luis I. “Ocupava um bizarro conjunto de edifícios entre a rua depois chamada do Casino da Ponte, à cota do tabuleiro superior e, lá em baixo, a Calçada da Serra, distribuindo-se por patamares pela escarpa abaixo. O edifício principal aproveitara as cantarias do demolido mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto”. Gonçalves Guimarães em O Polo Industrial da Serra do Pilar.
Este edifício era da propriedade de Abílio Loureiro Dias, que o arrendou a José Luis de Couto Querido. Este instalou o casino que foi destruído por um grande incêndio em 21/8/1919.


“A história deste clube, que começou por ser uma sociedade recreativa (Sociedade Nova Euterpe, fundada em 29 de agosto de 1869) para se tornar num clube burguês, está intimamente ligada à própria história da cidade do Porto, identificando-se especialmente com as suas atividades culturais e cívicas. Ainda hoje os ideais desta associação mantêm uma "cultura da pluralidade", recebendo e promovendo actividades culturais e artísticas num clube privado aberto à cidade. Esta tendência de disponibilizar ao exterior o usufruto de alguns dos seus espaços remonta às suas origens, no século XIX. 
A primeira sede desta sociedade, na Rua da Porta do Sol, foi mais tarde substituída, a 31 de maio de 1885,por um edifício mais apropriado, situado na Rua de Passos Manuel, no centro da Baixa portuense. 
Detém na sua biblioteca mais de 80 mil volumes e possui um museu privativo.” (Infopédia)


Foto dos anos 40 do séc. XX


O Clube de Leça foi fundado em 1/9/1884 na casa de Gustavo Adolfo de Sousa Oliveira, tendo pouco depois passado para uma casa pertencente a José Nogueira Pinto, onde esteve atá 1914. Após ter passado por várias dificuldades, mudou em 1938 para o local onde ainda hoje se encontra. Durante a sua existência lá se realizaram muitas sessões culturais, concertos, reuniões dançantes, excelente serviço de restaurante. Por lá passaram alguns dos maiores artistas musicais nacionais e estrangeiros, destacando-se Óscar da Silva e Guilhermina Suggia. Mas muitos outros vultos do teatro, literatura e outras actividades culturais por lá passaram. 
Depois e uma grande crise durante os anos 80 e 90, o clube “renasceu” pela entrada de novos sócios interessados em dinamizar o clube. 
Hoje está em plena actividade, sobretudo no Verão, com a presença de muitos sócios e de seus filhos, atraídos pela piscina. 


O Brig. Nunes da Ponte fala-nos no Clube de Leça em 16/2/1901: “para as festas e reuniões onde se dançasse, mesmo nos clubes ou casinos de verão, era rigorosamente exigido o uso de luvas. Nos bailes calçavam-se luvas brancas. 
Nenhum rapaz convidava qualquer senhora para dançar sem que previamente tivesse sido apresentado aos pais ou pessoas de família que as acompanhassem, e durante as festas as mamãs sentavam-se geralmente junto das suas filhas, cujos passos pressurosamente vigiavam”.

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