domingo, 28 de fevereiro de 2016

MATOSINHOS, LEIXÕES, LEÇA DA PALMEIRA - I

6.3.9 - Matosinhos, Leixões, Leça da Palmeira - 1


“Mapa he ademonstração da Costa do Mar desde a Villa de Matozinhos, athe a Barra da Cidade do Porto 
Por Jozé Gomes da Cruz, Piloto das Naus de Guerra. 1775
Cópia de 1906”. Arquivo da APDL.

Parte do texto desta imagem:
« (…) defronte da dita villa (Matosinhos) se reprezenta a grande pedra de Leixões, que pode servir para asento de hum castello, à sombra do qual tenhão abrigo os navios que não poderem entrar na Barra da dita Cidade do Porto, também se pode entulhar pela parte do Norte com Navios velhos carregados de pedra, hum espasso que ha entre a dita pedra e outras que lhe ficão pela parte do Norte (…) desta obra rezultará no tempo de Guerra escuzarem de hir os Navios recolher-se a Galiza e lá fiquarem prizioneiros, ou perderem-se hindos corridos com temporal (…) ficarão os navios assim abrigados dos ventos Sues, Oestes, Noroestes e Nortes, e não lhe poderão fazer muito danno os mais ventos (…) ».
A pequena reentrância que se vê entre Leixões e o Rio Douro deverá ser o carreiro do molhe que nesta data ainda não tinha sido construído.


Molhe Norte visto dos Leixões

«… porque estando (…) metidos ao mar huns escabrosos penhascos, a que chama Leixoens o vulgo; por mais que as tempestades embravecidas ostentem nelles com encapellada inchação e horrorosos deliquios, nunca nelles se vio haver naufragio, antes sim seguro asylo a toda a embarcação, que de proposito encaminha o rumo a este surgidouro admiravel, para salvar-se de todo, o que de outra sorte seria infallivel estrago, e notorio perigo, conseguindo deste modo bonança na mais furiosa tormenta.» António Cerqueira Pinto, História da Prodigiosa Image..., 1737.
« Em distancia de hum quarto de legoa a o mar, em direyto da boca do rio, está descoberta hua penha de grande e plana área, (…) dizem os engenheyros que se pode edificar hum cáys para ir a pé enxuto ao dito penhasco grande chamado Leyxoens edificar hua boa Fortaleza para defesa de hum surgidouro excelente de grande quantidade de Navios, muyto util para todo o tempo, muyto mais para o em que não podem entrar (n)a Barra do Porto, por seus continuos perigos. » Pde. Luís Cardoso, Memórias Paroquiais, 1758.
“Quis Deus ou a Natureza que na foz do rio Leça, a meio quarto de légua da costa, se elevasse das águas atlânticas um conjunto de rochedos a que os homens deram o nome de «Leixões». Eram o «Espinheiro», a «Alagadiça», o «Leixão» grande e pequeno, como grande e pequeno eram também os rochedos da «Lada». Mas havia também o «Tringalé», o «Galinheiro», o «Cavalo de Leixão», a «Quilha», a «Baixa do Moço», o «Fuzilhão», o «Baixo do Leixão Velho» e muitos outros…” Site APDL – os textos a que referirmos serem recolhidos no site da APDL foram escritos por Joel Cleto.


Situação de Leixões em relação ao Porto – 1892

“Numa costa frequentemente assolada por tempestades e nevoeiros, perigosos dada a existência de abundantes penedias traiçoeiras só visíveis nas vazantes, e que muito contribuíram para o sombrio e nefasto título de «Costa Negra» dado a esta região durante séculos, o refúgio formado naturalmente pela enseada dos Leixões não poderia deixar de escapar à atenção e argúcia dos Homens. E, com efeito, desde a mais recuada Antiguidade é a intervenção humana, mais do que a natural ou a do Criador, que moldará a história de Leixões. Mesmo que, para tal, muitas vezes tenham os mortais enfrentado as adversidades impostas pela natureza, e outras tantas tenham vencido o que pareceu ser a oposição do divino ou, quem sabe, a vontade do Demo.
Não bastavam já os Leixões, também o próprio rio Leça contribuía e reforçava o apelo ao abrigo. Deslizando suave, nesta etapa final da sua viagem, o rio desaguava num convidativo estuário, navegável para montante até uma distância considerável. Tais potencialidades eram já aproveitadas no 1º milénio A.C. quando, muito próximo da sua embocadura, numa elevação da margem esquerda que hoje designamos por Monte Castêlo, surge um importante povoado da Idade do Ferro: o Castro de Guifões, habitado por Brácaros Galaicos. Na base do morro, junto ao rio, desenvolver-se-ia, seguramente, uma estrutura portuária, ainda que incipiente. Os achados arqueológicos recolhidos vêm atestando da chegada – por via marítima - de produtos originários de paragens longínquas.
Colonizado pelos romanos, a partir do século I A.C., o Castro de Guifões pertence agora, e insere-se com assinalável sucesso, no vasto espaço económico e comercial que é o Império Romano. Salvaguardadas pelos Leixões e conduzidas até à elevação onde se implantava este povoado através do rio Leça, as embarcações da época aqui fazem chegar produções agrícolas do sul da Península, conserva de peixe do estuário do Sado, cerâmicas e outras expressões da cultura material de Itália, sul de França, norte de África, oriente mediterrânico… Desta forma, a foz do Leça transformava-se , há já dois mil anos, num importante interface portuário e comercial da região, muito especialmente para os restantes povoados que se implantavam na bacia deste rio ou nas suas cercanias. E, desde então, ao longo da História, não mais a foz do Leça e o seu porto marítimo-fluvial deixaram de possuir tal importância. Por vezes a uma escala regional reduzida, muitas outras influenciando vastas áreas.
Entretanto o domínio romano resultara, igualmente, num povoamento mais disperso e contribuíra para uma maior aproximação das populações ao litoral marítimo e às margens fluviais. Neste contexto, ainda durante os primeiros séculos da nossa Era, iniciar-se-á a ocupação do espaço hoje coincidente com a cidade de Matosinhos-Leça. E se para esta última freguesia, implantada na margem direita da foz do rio Leça, uma vez mais a arqueologia revelou recentemente provas dessa ocupação tão remota, para o caso de Matosinhos, na margem esquerda, é a própria origem do topónimo. Site APDL


Proposed Harbour at Leça, 1865 
James Abernethy - London para um porto na foz do Leça 
Arquivo da APDL


Albano Sarmento - 1963


Velha ponte romana de pedra no Rio Leça
 

Portugal Antigo e Moderno – 1870


Pormenor de Plan denoting course of the proposed Line of Tram-way - (planta da proposta de uma linha férrea ligando a cidade do Porto a Leixões, ao longo da orla marítima e da Foz do Douro), incluída no "Relatório de William Freebody". Londres, 1854. Arquivo da APDL.


“Com a ideia de construir um porto artificial em Leixões a ganhar forma, para obviar as dificuldades da barra do Douro, em 1879 o engenheiro inglês James Abernethy propôs a construção de um canal que, atravessando Matosinhos e o que é hoje a orla marítima da cidade do Porto, conduziria as embarcações desde os futuros molhes de Leixões até ao Douro, evitando a sua barra. Na verdade, argumentava-se, apenas a embocadura do rio era perigosa, não apresentando o resto do seu curso ao longo dos cais portuenses grandes dificuldades. Eram, sem dúvida, fortes as pressões contra o desvio do tráfego marítimo do Porto para Leixões, que ficava a muitos quilómetros da cidade e tinha acessos muito deficientes. De qualquer forma, a construção do porto de Leixões acabou mesmo por avançar, não se construiu nenhum canal e os portos do Douro acabaram por ir definhando progressivamente”. Site da APDL


Projecto do Porto de abrigo de Leixões – 1892

Após mais de cem anos de desacertos com Lisboa e conflitos de interesses entre portuenses, a tragédia do vapor Porto foi decisiva para se começarem os estudos e a construção do Porto de abrigo de Leixões. 
Projectada pelo engenheiro Afonso Nogueira Soares, o porto de abrigo, foi inaugurado em 1895, embora desde há dois anos os barcos aí carregassem e descarregassem passageiros e carga, por meio de batelões. Em 13/1/1915 foi aprovado o empréstimo de 7.500 contos para adaptação do porto de abrigo a porto comercial.


«Porto de Leixões. Planta Geral das obras de melhoramento e de construção do Porto Comercial», in Adolpho Loureiro e Santos Viegas, Porto de Leixões. Projecto do melhoramento …, Lisboa, 1908.


Variante nº. 2 à planta acima de Abril de 1916 – projecto definitivo pelo Engº. Daniel Gomes d’Almeida.


...


O Tripeiro – volume 4

« Não se doma facilmente o oceano, não se modifica, sem ter que vencer grandes dificuldades, a obra espontânea da natureza. 
Mas a ciência, a engenharia hidráulica, confiada nos seus poderosos recursos, ia encetar a luta com o oceano, e estava certa de vencê-lo, não sem violentas refregas e frequentes conflitos com tão valoroso adversário. 
Por sua parte, o mar revirava o dente à hidráulica, procurava reaver o terreno que a ciência lhe conquistava, e, apesar de ficar vencido na luta, ainda não está resignado com a derrota, ainda de vez em quando, como aconteceu o ano passado, se arremessa em fúria contra o porto de Leixões para desfazê-lo. » Alberto Pimentel, O Porto de Leixões …, 1893.


Molhe Norte em construção, foto de 1913 - esta foto está ao contrário, pois o molhe deveria virar para a direita, lado Norte. O barco ao longe, à esquerda, será o Veronese encalhado e é bem visível a… 


…Capela de S. João da Boa Nova ainda sem o farolim ao seu lado, construído só em 1916.


Construção dos molhes – 31-8-1889

“Estavam pois, finalmente, reunidas as condições para se iniciar a construção do Porto de Leixões e, ainda em 1883, por decreto de 23 de Outubro, era aberto um concurso internacional. Na sequência deste é lavrado, logo em Fevereiro do ano seguinte, o contrato com os empreiteiros franceses «Dauderni et Duparchy» que haviam vencido o concurso (em boa verdade haviam sido os únicos a concorrer). Valor da adjudicação: 4.489.000$00 (reis). Durante o período da construção ocorreria a morte de Dauderni, passando a empreitada para o nome de «Duparchy e Bartissol», o que não colocou em causa os prazos previstos: entrega provisória em 1892 e definitiva em 1895.
As obras de construção do Porto de Leixões iniciaram-se em 13 de Julho de 1884 e os trabalhos foram dirigidos pelo engenheiro francês Wiriot, sob a fiscalização do governo português que, para tal, nomeou o Engº Nogueira Soares, autor do projecto. Projecto que, fundamentalmente consistia na construção de dois extensos paredões ou molhes (o do lado Norte com 1.579 metros e o do lado Sul com 1.147), que enraizados nas praias adjacentes à foz do Rio Leça, formavam uma enseada com cerca de 95 hectares, com fundos entre 7 e 16 metros de profundidade. Além dos paredões foi construído, igualmente, um quebra-mar que, elevando-se apenas um metro acima do zero hidrográfico, prolongava em mais algumas centenas de metros o molhe norte. Terminava este esporão numa plataforma onde emergia um farolim". Site APDL


“… um dos titãs foi, também ele, protagonista de um fortíssimo temporal ocorrido na noite de 22 para 23 de Dezembro de 1892. Para a memória do porto fica então a queda ao mar do colosso do molhe norte. Só mais de três anos depois, em Abril de 1896, após muitos estudos e esforços, se conseguiria recuperar aquele titã do fundo marinho, com o auxílio de potentes macacos mecânicos assentes sobre barcaças. Rapidamente recuperado, o gigantesco guindaste retomou a sua actividade”. Site APDL



Grua que transportava os blocos de pedra, de 50 toneladas, para os titãs.


1885

Rochedos de Leixões e extremidades dos dois molhes – Titã, um dos grandes guindastes construídos propositadamente para esta obra e grua utilizada para erguer e transportar sobre carris os blocos artificiais de 50 toneladas, junto ao Senhor do Padrão. Fotos de Emílio Biel – Arquivo da APDL



Pedreiras de S. Gens


Pontão de madeira para o transporte de areia par a construção do molhe Norte – foto Emílio Biel


Ramal de Leixões às pedreiras de S. Gens – ver filme abaixo

“O assentamento dos molhes fez-se, preferencialmente, sobre os diversos rochedos que, ao largo, já constituíam o porto de abrigo natural: os leixões, donde resultou a designação do porto. E, para a construção dos molhes, foi utilizado o granito de pedreiras próximas, a mais importante das quais foi a de S.Gens (Custóias) que se viu ligada a Leixões por uma linha de caminho de ferro, com cerca de sete quilómetros de extensão, construída expressamente para esse fim. Chegadas as pedras aos estaleiros e oficinas, montados em Matosinhos e Leça da Palmeira, estas eram então trabalhadas e conglomeradas de forma a darem origem a enormes blocos graníticos que chegavam a atingir as 50 toneladas”. Site APDL 


Estaleiros da construção do Porto de Leixões

Ramal de Leixões às pedreiras de S. Gens – Cinemateca Portuguesa 

Porto de Leixões – Cinemateca Portuguesa 

2 comentários:

  1. Olá
    Mais uma grandiosa obra....
    Cumprs
    Augusto

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  2. Muito obrigado pela sua gentileza e persistência em nos ler.
    Cumprimentos
    Maria José e Rui Cunha

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